situação na Universidade Federal
Rural da Amazônia (Ufra), que já era ruim, está pior. Depois de uma sucessão de
denúncias ao Ministério Público Federal (MPF) para a reitora Herdjânia Lima
retirar os diretores nomeados de forma pro tempore há quase
três anos e convocar eleições internas de diretores de campi do interior e
institutos, uma série de manobras permitiu a impugnação de urnas e garantiu a
escolha de “candidatos de confiança”, os mesmos pro tempore.
Dias atrás, a Reitoria da Ufra
divulgou um extenso comunicado atacando a Coluna Olavo Dutra, a quem acusa de
publicar falsas notícias a respeito do processo eleitoral e, ao fim e ao cabo,
sobre tudo que se refere à Universidade. A coluna tentou contato com o gabinete
da magnífica reitora, mas não obteve resposta e tampouco recebeu o comunicado,
aparentemente restrito à comunidade universitária.
A quem interessar possa, os fatos
narrados a seguir não foram produzidos por uma mente fértil durante o fim de
semana. Circulam dentro da Universidade e nas redes sociais e sobretudo
denunciados por pessoas que se julgam prejudicadas pela gestão e, neste caso,
pela Comissão Eleitoral, acusada de “práticas duvidosas”.
A prova dos nove
A prova são os protestos de docentes
e acadêmicos, que gritam sozinhos, tamanha a passividade do MPF em não realizar
qualquer acompanhamento do pleito eleitoral, mesmo após as denúncias de
professores divulgadas pela imprensa.
As manobras atribuídas à Reitoria são
as mais diversas, entre as quais a aprovação de regimentos para as próprias
eleições que contrariam outros documentos; portarias feitas em conselho em que
os membros são pro tempore e impugnação de urnas onde a
votação ocorreu de acordo com as próprias diretrizes definidas pela Comissão
Eleitoral.
Inusitadas, no mínimo...
Esta comissão, em decisões no mínimo
inusitadas e ferindo todo o regimento da Universidade sobre as eleições, elegeu
“chapas brancas” com anulação de inscrições sem justificativa e até decisões
contra a própria comissão, mas com o suposto objetivo final de atender aos
interesses de manter a reitora com maioria dos mesmos diretores - que eram pro
tempore -, e que agora serão oficializados como “eleitos”.
Inicialmente, após a apuração, dos
nove cargos em votação, a Reitoria conseguiu eleger candidatos em três. Outros
três foram de chapas únicas, e em mais três ganharam chapas da oposição.
Mas a alegria dos candidatos com esse resultado durou pouco, já que, como a
abertura dessas urnas contrariou os interesses da Reitoria, a professora
Herdjânia se reuniu com a sua chapa perdedora para elaborar um plano, qual
seja, impugnar uma urna de servidores da Fazenda Escola de Igarapé-Açu,
justamente a que daria a vitória à chapa de oposição.
Impugnações convenientes
Curiosamente, a Comissão Eleitoral
impugnou a urna virtual criada por ela mesma, sob a alegação de que somente
depois da apuração se deu conta de que ela, a comissão, não poderia ter
autorizado o uso do mecanismo virtual. Ocorre que a impugnação mudou
dramaticamente o resultado das eleições do Instituto da Saúde e Produção Animal
onde, sem surpresas, acabou vencedora a chapa da atual diretora, ocupante do
cargo indicada de forma pro tempore.
Segundo informações de professores, a
titular da chapa vencedora e seu vice-diretor, também indicado, são fiéis
apoiadores da reitora, com bolsas de coordenação em projetos institucionais
como o Forma-Pará e o Projeto Amapá, no qual o marido da atual diretora recebe
uma bolsa no valor de R$ quase 7 mil.
Além disso, a regra mudada nesta
eleição tem outro fator grave: quebrar a paridade prevista no regimento e tão
buscada pelos docentes e discentes durante a convocação apressada das eleições,
que, desde o início, com prazos apertados e sem os debates regimentais
previstos, parecia anunciar as manobras.
Só não vê quem não quer
Professores, técnicos e discentes,
estes sim, viram tudo. E avisaram, mas não teve jeito. Assim, a quebra da
paridade fez com que a chapa da Reitoria ganhasse também no campus de Capitão
Poço. Foi um resultado raquítico e misterioso, apontando apenas 26 votos de
alunos em um campus que tem mais de 800 estudantes e que, pelo menos no quesito
eleições, aparenta não ter nenhum professor e nenhum técnico
administrativo da Universidade.
Como esse quadro não parece
verdadeiro e reflete grandes sinais de fraude eleitoral, as manifestações em
Capitão Poço começaram no mesmo dia da eleição, dia em que não havia sequer
energia elétrica no campus para a realização do pleito. O corte da energia,
suspeita-se, teria ajudado no afastamento de toda uma comunidade estudantil e
de técnicos, garantindo o resultado favorável à Reitoria, já que uma consulta
com o campus lotado seria de alto risco, uma vez que a reitora e seus
apoiadores não são muito populares por lá.
Passo a passo das manobras
A eleição, ocorrida no último dia 18,
começou contrariando o calendário eleitoral, já que, somente no último dia 22,
a comissão divulgou e imediatamente inverteu os resultados com os recursos
contra as urnas virtuais, um erro da própria comissão que, agora se sabe, de
forma calculada, solicitou ao Tribunal Regional do Pará (TRE-PA) apenas 27
urnas eletrônicas, ou seja, contemplando apenas os campi. Lá pelas tantas, no meio
do processo, a comissão deve ter se lembrado da existência das fazendas-escolas
e as incluiu no sistema Votanet, que também é do TRE-PA. Contudo, a comissão,
também estranhamente, esqueceu de atualizar a resolução que dizia que somente
poderiam votar pelo sistema alunos de turmas especiais.
Com esse “esquecimento”, a comissão
recuou e optou, de forma arbitrária, por anular todos os votos das
fazendas-escolas de Igarapé-Açu e Castanhal. Não bastasse, a comissão induziu
os servidores ao erro, quando publicou e criou urnas eletrônicas em separado
para eles - votos que foram eliminados de forma arbitrária após a contagem
final.
Na “cara dura” mesmo
O mais escrachado é que essas
decisões foram tomadas após a conferência dos votos, já com o conhecimento de
que todos os votos da Fazenda Escola de Igarapé-Açu (Feiga) foram para a Chapa
1, que fazia oposição à reitora Herdjânia Lima. O resultado, como em Capitão
Poço, foram protestos dos estudantes e servidores pelo “cerceamento do direito
ao voto”.
Com esse cenário, tudo indica que os
próximos capítulos do processo eleitoral será uma disputa judicial, com
denúncias formalizadas já a partir de hoje, segunda-feira, 25, para que a
Justiça, talvez - quem sabe -, faça valer a vontade real da comunidade
acadêmica.
Descuido ou conivência?
A coluna, naturalmente, consultaria o
MPF se as informações escritas aqui não tivessem adentrado a noite da última
sexta-feira, 22. Porém, diante de todos os fatos ocorridos, e devidamente
registrados, está bem claro que o MPF não moveu um dedo na direção do que
informou à coluna há duas semanas, ante a cobrança de um posicionamento sobre
as denúncias em relação às arbitrariedades já em andamento na ocasião, dentro
do processo eleitoral.
Nota do “fiscal da lei”
“Diante das informações apresentadas
pelo portal do jornalista Olavo Dutra, o Ministério Público Federal vai
analisar quais novas medidas irá tomar para confirmar a existência ou não de
descumprimento de obrigações legais e/ou de compromissos assumidos pela Ufra
com o MPF”.
Pelo visto, a análise do MPF não foi
concluída a tempo de evitar o pior na Ufra, da mesma forma que parece não ter
nada a “analisar” em outro grande campus universitário da Região Metropolitana
de Belém.