m Edmilson Rodrigues feliz, sorridente, leve e solto era visto na última quarta-feira, 12, em Brasília, espremido em um paletó cinza escuro, gravata vinho e uma vistosa faixa verde no pescoço. Sentado de pernas abertas - sem preocupação com a etiqueta -, mantinha a mão esquerda repousada sobre a perna correspondente. A mão direita parecia um campo de batalha entre dois dedos, um friccionando a unha do outro. À altura do estômago, porém, a disputa envolvia o botão superior do paletó cinza e uma barriguinha adquirida com os anos.
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Nesse cenário, a Fundação Abrinq
estendia o tapete vermelho pelo qual o prefeito de Belém voltou a receber o
título do Programa Prefeitas e Prefeitos Amigos da Criança, correspondente a
2021-2024.
Detalhe: a observação segundo a qual
os dedos da mão direita do alcaide pareciam brigar entre si deve ter sido um
ataque de pareidolia do redator - que a ciência explica, no português claro,
como um fenômeno psicológico que faz as pessoas verem “chifre em cabeça de
cavalo”. Na verdade, Edmilson contava nos dedos o número de títulos
conquistados nessa categoria, o que faz dele um tetracampeão, ora bolas!
Dignidade às crianças
“Recebo pela quarta vez a premiação,
sendo que apenas duas cidades que são capitais tiveram essa distinção. É um
reconhecimento da Abrinq ao prefeito da cidade que promove políticas voltadas à
garantia dos direitos das crianças, em políticas que buscam dar dignidade a
todas as crianças”, destacou o chefe da comuna esboçando o conhecido sorriso.
A cada dois anos, a Fundação Abrinq
abre um processo seletivo para que organizações da sociedade civil que atendem
diretamente crianças e adolescentes possam participar do programa Nossas
Crianças. Em 2021, assim que tomou posse, Edmilson Rodrigues, que já fora
premiado por três vezes nos dois mandatos, entre 1997 e 2004, assinou novamente
um convênio com a entidade. Essa oferta de convênio da Abrinq é feita a outras
prefeituras e entidades.
Informações “oficiais”
Com o convênio assinado, a prefeitura
passou a fornecer informações sobre projetos que visam à implantação, ampliação
e qualificação do atendimento a crianças e adolescentes no município. O
processo seletivo é composto por etapas de análise de documentos e requisitos
de participação da organização e do projeto; análise do projeto; visita aos
projetos selecionados; e avaliação dos finalistas e aprovação dos projetos. As
organizações aprovadas recebem assessoramento durante dois anos, assim como
também passam a integrar a Rede Nossas Crianças.
Crianças nas ruas
Aqui reside a questão: a Fundação
Abrinq analisa os projetos que são encaminhados pelas próprias prefeituras. No
caso de Belém, é possível que os integrantes da Fundação Abrinq não tenham dado
uma volta pelas ruas da cidade, em especial em algumas esquinas da capital,
onde mães oriundas da etnia Warao, da Venezuela, ficam com suas crianças
pedindo ajuda em dinheiro aos que passam.
Essas crianças não estão em escolas
ou creches e não fazem parte de projetos da Prefeitura de Belém. E esse
problema se arrasta sem solução visível desde 2017, quando teve início a
migração dos Warao para o Brasil e Estados da Região Norte.
Então, do que sorria o prefeito de
Belém celebrando o tetra? A invisibilidade dessas crianças não parece constar
de nenhum projeto da Prefeitura de Belém.
Filhos da Escola Circo
Entre os anos de 1997 e 2004, quando
foi prefeito de Belém, ainda militando no PT, Edmilson Rodrigues tinha orgulho
de ter criado a Escola Circo, no bairro da Cremação, que ensinava as artes
circenses a crianças e adolescentes. Com base também nesse projeto, ele foi
eleito pela Abrinq para o programa Prefeitas e Prefeitos Amigos da Criança por
três vezes. O que nunca ficou claro foi o direcionamento que se daria a quem se
formava na Escola Circo. O que se viu por muito tempo nas ruas foram crianças e
adolescentes praticando artes circenses aprendidas na escola em troca de alguns
trocados nos sinais de trânsito da cidade.
Outros premiados
O da Abrinq reconheceu 100 gestores
municipais que fizeram parte do programa. No total, 58 gestores do Nordeste, 22
do Sudeste, dez do Sul, oito do Norte e dois da região Centro-Oeste receberam a
honraria.
Do Pará, os contemplados, além de
Edmilson, foram Francineti Maria Rodrigues Carvalho, de Abaetetuba; Maria
Lucidalva Bezerra Carvalho, de Almeirim; André Rios de Rezende, de Pacajá;
Nélio Aguiar da Silva, de Santarém; Celso Lopes Cardoso, de Tucumã, destaque
nacional da região; e Márcio Viana Rocha, de Vitória do Xingu.
O programa foi criado em 1996 e busca
mobilizar gestores municipais em todo o País visando apoio técnico aos
municípios na implementação de ações e políticas que garantam os direitos das
crianças e dos adolescentes, com acompanhamento próximo, seminários e
oficinas. Não são previstos prêmios em dinheiro e cada contemplado recebe troféu,
diploma e o título.