Desregrado e decadente, Centro Comercial de Belém é o mais puro retrato da incompetência

Nas últimas décadas, administrações municipais se sucederam em soluções paliativas e o resultado, hoje, tão histórico quanto a área, é um legado que se devolve aos legítimos donos.

Por Olavo Dutra | Colaboradores

24/11/2024 08:00

Imagens chocantes mostram um centro comercial caótico, sinal de que o passado não serviu para desenhar o presente, muito menos o futuro da cidade/Fotos: Coluna Olavo Dutra.


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as mesmas esquinas de onde, varando os tempos, viam-se famílias bem arrumadas caminhando sobre espaços vagos, mas concorridos, fazendo compras; dois ou três destacados comerciantes trocando ideias nos primeiros raios da manhã e sob a brisa que se esgueirava por entre ruas estreitas soprada pela Baía do Guajará; trabalhadores abrindo portas e lojas de sapatos, armarinhos, de material esportivo e de joias se ofereciam aos clientes sem alardes, hoje em dia, postada nessas mesmas esquinas do passado, nem mesmo a mente mais sombria poderia imaginar o vergonhoso grau de degradação a que chegaria o Centro Comercial de Belém que, um dia, o empresário Said Xerfan, dono de lojas de tecidos e então prefeito de Belém, sonhou e ergueu o que chamou singelamente de Belo Centro - uma área comercial limpa, arejada e convidativa.

 

O Centro Comercial nos anos 1960, hoje apagado pela desordem pública/Arquivo.
 

Passado e presente

 

Se é verdade que o presente se constrói com o olhar no passado, seguidas administrações da cidade, algumas permissivas demais, outras impotentes pela própria natureza, não enxergaram o passado, nem além dele - aquele que deu origem à capital do Pará. Pecaram por omissão, ou por falta de espírito público, e se apegaram aos próprios interesses de umbigo, castigando, ao ignorar as partes, o todo da população. Hoje, graças a elas, o Centro Comercial é o mais fiel retrato do descaso, do desrespeito público e da decadência.

 

Uma imagem chocante

 

Dia desses, um velho amigo encaminhou uma fotografia acidental e curiosa à Coluna Olavo Dutra. À primeira vista, parecia um amontoado de embarcações empilhadas - e essa impressão acabou de tal maneira encravada que já não parece mais possível removê-la da mente. De um outro amigo do redator, a quem a fotografia foi mostrada, veio a seguinte impressão: “Gostei - muito - dessa foto. Os trilhos indicam a trilha da miserável cidade que não menos miserável prefeito plantou. É forte para prêmio”. Trata-se, portanto, da imagem que abre o relato a seguir sobre o Centro Comercial de Belém, de onde o passado foi apagado por conveniências políticas e deu lugar a um presente sofrível, do qual o futuro foge como o diabo foge da cruz. Para essa Belém caquética, a COP30 manda lembranças.   

 

Por onde não passa a COP


Belém passa por intervenções físicas milionárias em áreas históricas por conta da COP30, entre elas o Mercado Ver-o-Peso e a avenida Visconde de Souza Franco, a Doca. Dessas obras, todo mundo já sabe. O que talvez muita gente ignore, desconsidere ou tenha esquecido, é que um pedaço significativo da cidade está completamente à deriva - sem organização e sem as regras, seja de ocupação ou de mobilidade urbana: é o Centro Comercial.


A potoca das regras

Nos últimos anos, tem sido flagrante a deterioração das regras e o penar de quem se arrisca a transitar pelo comércio popular de Belém. A ordem pública sumiu. Independente do acesso que o cidadão possa fazer, seja pelo Boulevard Castilhos França, pela rua Portugal, ou pela travessa Padre Eutíquio, as barreiras e obstáculos tomam conta da desregrada área histórica da cidade. Nada foi feito para equilibrar a dinâmica da economia informal, desnudando um escandaloso desfavor ao ir e vir.


Desordem acima de tudo

As barreiras, bem visíveis - caso das travessas Padre Eutíquio e Campos Sales, além da rua 7 de Setembro - foram praticamente institucionalizadas. Sem fiscalização ou qualquer possibilidade de ajuste no ordenamento, o consumidor sofre para atravessar a rua 7 de Setembro, trecho entre a Manoel Barata e a 15 de Novembro. Um variado comércio tomou conta da via pública, das ruas e das calçadas. As calçadas, na maioria dos casos, são ocupadas por caixas com mercadorias, mas também por assentos para acomodar clientes das barracas de venda de comida. Sem qualquer cerimônia, é fácil encontrar serviços de designer de sobrancelhas e de manicure, além do lixo, impedindo o fluxo de pedestres.


“A Deus pertence”

 Quem um dia viu a rua João Alfredo e a continuidade dela, a rua Santo Antônio, sentido Presidente Vargas, espanta-se: um emaranhado de lonas toma conta do visual da rua estrangulada e sem fôlego. Lembra um grande cortiço. Um comerciante tradicional lamenta o “estado de coisas”. “Difícil pensar em uma saída no médio prazo. Vamos ver o que o novo prefeito pretende fazer”, soluça, consolidando a resiliência histórica.

 

Frequentador do comércio, muito mais na época de Natal, o cametaense Manoel Menezes critica a desorganização e as irregularidades. “A gente não pode se acostumar com isso. Fico triste de ver o comércio desse jeito”, lamentou. “Acho que todo mundo tem o direito de ganhar seu dinheiro, mas é preciso melhorar para beneficiar a todos”.



 

Papo Reto

 

· O que se diz é que na lista de “achados e perdidos” que circula nos corredores do Tribunal de Justiça do Pará consta o telefone celular de um magistrado no qual haveria conteúdos relacionados à pedofilia. E mais não se diz, embora haja muito o que dizer.

 

· Recentemente, a Assembleia Legislativa criou o Cadastro de Pedófilos, que prevê identificar pessoas envolvidas nesse tipo de crime, mas a lei ainda não está regulamentada. Pelo sim, pelo não, a lista parece que está cada vez maior.

 

· O ministro Jader Filho, das Cidades (foto), participa amanhã, em Belém, do "Simpósio para o Fortalecimento da Gestão Municipal no Pará 2025-2028", promovido pelo TCM, no Hangar. A ideia é oferecer capacitação e orientações técnicas a prefeitos, vereadores e equipes de transição, que assumem os mandatos em janeiro de 2025.

 

· O evento também terá a presença do governador Helder Barbalho, presidente do STF, ministro Luís Roberto Barroso, ministro André Mendonça, do STF, presidente TCU, ministro Bruno Dantas, e da ministra-substituta do TSE, Edile Lobo. 

 

· Um bar chamado “Vero”, novo point da Benjamin Constant, entre Braz e Nazaré, não satisfeito em tomar a calçada dos transeuntes, agora ocupa metade da pista Benjamin.

 

·  Depois de 16 meses em obras, o Mercado de São Brás será reinaugurado no dia 13 de dezembro. A ideia é devolver ao prédio histórico o glamour do início do século, sem deixar de atender às necessidades da população.  O investimento é de R$ 125 milhões.

 

· A Prefeitura de Ananindeua segue até o final deste mês com a campanha "Fique em Dia", que permite a pessoas físicas e jurídicas a regularização de débitos tributários com descontos de até 100% em multas e juros e parcelamento em até 60 vezes.


· A campanha abrange o Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana, Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis, Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza e Alvará de Funcionamento.

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