De macaco para homem, alguma coisa foi mal planejada na rua onde a COP30 não vai passar

Obra de prolongamento da rua da Marinha está embargada pela Justiça, mas, para a fauna silvestre, que perde território, “Inês é morta”.

Por Olavo Dutra | Colaboradores

26/11/2024 12:20

Macacos desolados na área do Parque Ambiental de Belém onde passa a rua da Marinha, temporariamente embargada pela Justiça/Fotos: Divulgação-Redes Sociais.


V

 

ivo aqui desde sempre. Desde que me entendo como macaco, se é que me entendem. Eu, minha família, os bichos-preguiça, cobras, jacarés e pássaros, muitos pássaros. Alguns vêm e vão de vez em quando, e dividimos nossa comida com eles. Dá para todos.

 

Escolhemos a vida sobre as árvores por questão de segurança. Nosso universo é grande - está fora do “Polígono da COP30” -, mas, sei agora, não é seguro. Os coatis, os tatus e outros bichos que vivem no chão têm vida mais difícil. Nós preferimos as árvores, pois era seguro - “era”, porque, apesar dos sinais, veio o cataclisma e viramos macacos sem-árvores.

 

Naqueles dias, os ventos passaram a perder o sentido. Meses antes, o jacaré se precipitou ao saber que o São Joaquim, igarapé onde perambulava à procura de presas, mudaria de curso. Desesperado e faminto, botou o pé na estrada e foi parar no elevado que existe lá adiante, e que, desde que inaugurado, desassossegou nossas vidas e promoveu o começo da fuga universal dos animais do nosso ambiente.  

 

Já havia muito barulho por aqui. De carros e de fogos, de buzinas e de gritos, principalmente em dia de jogo no Mangueirão. Com isso eu estava habituado, como até conseguia dormir com a música em alto volume que vinha do Mangueirão sem ter jogo. Era a festa deles, mas, desde que o vento perdeu a compostura, a vida ficou mais difícil.

 

Primeiro vieram os homens. Eu via tudo lá de cima. Depois chegaram os monstros de presas enormes e barulhentos e depois outros monstros vestidos de amarelo e outros monstros raspando o chão de onde derrubaram as árvores que eram nossa estrada. Eu e minha família e os outros que vivemos aqui nas árvores e no chão estamos que nem os ventos, que iam e vinham em todas as direções: descompensados e nervosos.

 

E então o cataclisma parou e o silêncio se abateu onde já não há mais mata, nem estrada, nem comida, nem homens, nem monstros. Só os fantasmas deles. Ainda não sei para onde vamos: para o Mangueirão, para a Usina da Paz, para o Hangar ou para o aeroporto.

 

Tudo está tão estranho. Aqui no que resta de mata, os bichos não têm nada a ver com a COP30. Nem estamos dentro do “polígono” onde devem desfilar os homens que vêm. Para onde vamos quando os monstros voltarem fazendo barulho e derrubando o que resta?

 

Uma conferência mundial

 

A Conferência das Partes é uma reunião anual de signatários da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, e tem como objetivo debater medidas para diminuir a emissão de gases do efeito estufa, encontrar soluções para problemas ambientais que afetam o planeta e negociar acordos. Participam da conferência todos os 193 países da ONU e cinco territórios. A primeira COP ocorreu em 1995, em Berlim, na Alemanha.


Detentor da maior biodiversidade do planeta e nona maior economia do mundo, o Brasil sediará pela primeira vez a conferência em 2025. A COP será entre os dias 10 e 21 de novembro, em Belém. Trata-se de um espaço importante para o diálogo e a cooperação entre os países e com o objetivo comum de conter o aumento da temperatura global para evitar efeitos como aumento do volume de oceanos e a redução da disponibilidade de água.


Fuga universal dos bichos

O Parque Ambiental Gunnar Vingren é justamente onde vivem macacos e outros animais. A gestão é da Prefeitura de Belém. Por dentro desta unidade de conservação passa a rua da Marinha, sujeita a um projeto de prolongamento conduzido pelo governo do Estado, sem licenciamento ambiental do município. Essa foi a fronteira que determinou a suspensão temporária da obra pela Justiça do Pará.  

 

Segundo informações oficiais, o governo do Estado, ao considerar as dimensões do território do município de Belém, de pouco mais de 500 quilômetros quadrados - noves fora 65,4% correspondentes a região das ilhas -, criou o chamado “Polígono da COP30”, recorte do território onde se prevê a área de circulação dos visitantes. A área é delimitada ao norte pela avenida Júlio César; a oeste pela avenida João Paulo II; ao sul pela rua dos Mundurucus e a leste pelo complexo do Ver-o-Peso e pela avenida Pedro Álvares Cabral.

 

A rua da Marinha não está incluída, mas, conforme os homens avançam, os bichos perdem território no Parque Ambiental de Belém.



 

Papo Reto

 

· A batata da Embratur, acusada de abrigar um rio de servidores fantasmas, está assando no Tribunal de Contas da União.

 

· Vale destacar que o ex-deputado federal Marcelo Freixo é quem preside a agência, que é subordinada à pasta do Turismo, comandada pelo ministro Celso Sabino (foto).

 

· Os são da Receita Federal no dia 13. A desoneração da folha de pagamento dos 17 setores da economia representou isenções de R$ 12,2 bilhões. O Programa Emergencial de Retorno do Setor de Eventos, R$ 9,6 bilhões. 

 

· O Judiciário brasileiro está no olho do furacão. As suspeitas sobre venda de sentenças alcançam seis tribunais estaduais e já levaram ao afastamento de 16 desembargadores e sete juízes.

 

·  Há indícios inclusive indícios de possíveis ramificações no Superior Tribunal de Justiça, apesar de os magistrados envolvidos negarem qualquer participação em atos ilícitos.

 

· Em meio às negociações do Ministério da Fazenda e Ministério do Planejamento para apresentar o pacote de cortes de gastos, dois programas que o setor econômico tentou barrar custaram R$ 21,9 bilhões de janeiro a agosto deste ano, 22% do total.

 

· Pergunta de um leitor da coluna: afinal, o que impede que, nas carteiras de identidade ou na CNH, inclua-se a informação de que o portador é um doador de órgãos?


· Para orientar os consumidores brasileiros que pretendem aproveitar as promoções da Black Friday deste ano, que ocorrerá dia 29 de novembro, a Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça e Segurança Pública lançou guia com orientações e direitos assegurados pelo Código de Defesa do Consumidor irem às compras de forma mais segura, consciente e não cair em golpes.

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