Pela hora da morte: rede pública de saúde agoniza em Belém; perdas envolvem pretos e pobres da periferia

Um dos problemas mais agudos é registrado por usuários da Unidade de Saúde do Conjunto Sideral; médico denuncia as razões do caos.

26/06/2023 00:29
Pela hora da morte: rede pública de saúde agoniza em Belém; perdas envolvem pretos e pobres da periferia

Jaqueline Barroso, 54, mora há 12 anos no Conjunto Sideral, no bairro do Parque Verde, em Belém. Há meses, Jaqueline tem deixado o bairro em busca de melhor atendimento médico, isso porque a Unidade de Saúde do Sideral não tem suprido minimamente as demandas do bairro.

 

“Sou hipertensa e não consigo renovar uma simples receita para adquirir meu remédio para controlar a pressão; não tem um clínico. É sempre assim. Está devagar lá no posto, tem muitos problemas. Não consigo exames, como de sangue e urina, nem um encaminhamento para uma transvaginal”, denuncia.  A alternativa é procurar outro bairro.

 

Junto à reclamação de Jaqueline, tem a da Alana Castro, 31, que não consegue atualizar a vacina da filha de um ano. “Era para ela tomar duas doses aos nove meses, mas não consegui. Não tem pediatra. É uma humilhação: nos jogam para assistente social e fica por isso”, diz.

 

“Costumo ir à UPA do Icuí, pois lá eu consigo melhor atendimento. Aqui no posto do Sideral, sem chance, tem o básico do básico, do básico. Caso alguém se acidente, tem que correr ao Icuí, Cidade Nova, Icoaraci ou Tapanã”, revela José Maria da Silva, 52, também morador do Sideral.


A realidade da saúde pública de Belém, capital escolhida para sediar a edição 30 da Conferência do Clima das Nações Unidas, prevista para 2025, pode ser exemplificada pelos depoimentos de três moradores, corroborados pelo médico Francisco Guimarães, concursado da Secretaria de Saúde de Belém há 20 anos, que trabalha no posto de saúde do Sideral.

 

 

Médicos e medicamentos

 

Ex-vereador, o médico expõe os problemas enfrentados pelos moradores da capital, os mesmos vivenciados no Sideral. O abandono da UMS se reflete na falta de médicos e medicamentos. Francisco conta que além dos problemas de desabastecimento de produtos hospitalares, o sistema de saúde de Belém convive com a baixa remuneração dos profissionais. “Para você ter ideia, o salário de um médico, o salário-base de um médico, em qualquer posto de saúde de Belém, é R$ 1.007,00. Não é nem um salário mínimo”, critica. Ele aponta o esvaziamento dos postos pelos profissionais devido aos baixos salários.

 

O médico revela um pouco mais sobre a falta de estrutura de atendimento. “Não tem o medicamento que o paciente necessita: você precisa de uma consulta especializada ou exame especializado, e quando é solicitado, a resposta é de um ou dois anos para se conseguir fazer um simples exame, e não tem, não tem nada de novas ideias nisso”, detalha. 

 

“Os pacientes, principalmente aqueles crônicos, de controle, eles acabam morrendo mais cedo. Isso compromete diretamente a vida da nossa população, exatamente a população mais pobre, a quem o (prefeito) Edmilson (Rodrigues) diz ter prioridade. Os tais, do ponto de vista ideológico, que gosta de usar - os pretos, os pobres da periferia -, são esses que são abandonados à míngua, com desassistência”, finaliza.

 

Legislação que mata

 

Segundo ele, o prefeito Edmilson Rodrigues, do Psol, se vale de uma súmula do Supremo Tribunal Federal, utilizada pelo prefeito anterior, Zenaldo Coutinho, que determinou que o valor do salário-base ficasse em R$ 1.007,00, uma vez que o vencimento total ultrapassava o valor do salário mínimo. “Para nossa surpresa, o Edmilson, que, por diversas vezes, na Câmara Federal, combateu e denunciou essa situação mantida pelo Zenaldo, simplesmente manteve”, disse.

 

A coluna encaminhou pedido de informações à assessoria de imprensa da Secretaria de Saúde e aguarda um posicionamento.

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