expressão "marista" refere-se à Rede Marista, uma longeva organização internacional de educação e evangelização fundada pelos Irmãos Maristas, seguidores de São Marcelino Champagnat. A rede é conhecida por suas escolas, colégios e universidades que deveriam promover uma educação baseada em valores cristãos, como solidariedade, respeito e espírito de família.
É essa expressão, “marista”, a que mais tem sido associada ao núcleo gestor da Prefeitura de Belém, constituído por jovens oriundos das elites econômicas da cidade, muitos deles colegas do atual prefeito no Colégio Nazaré. A esse conceito - ou preconceito - se associa a percepção de que esses auxiliares mais jovens não acumularam a experiência necessária em processos administrativos e políticos, o que pode resultar em decisões menos fundamentadas.
Apesar da diversidade de perfis, a composição do secretariado está sendo vista, de um lado, como um reflexo das alianças políticas que o governante fez para sustentar a eleição, e de outro, como fruto de escolhas pessoais do prefeito. Isso levanta a questão de até que ponto as escolhas foram baseadas em critérios técnicos, preferências pessoais do gestor ou em compromissos políticos.
Além disso, a juventude de alguns integrantes-chave, embora possa denotar inovação e energia, está sendo interpretada como um fator de fragilidade em um contexto que exige decisões rápidas e abalizadas em uma cidade que tem pressa em afetar - e nem se fala de COP30, mas dos problemas crônicas da cidade. O governo “marista” ainda precisa provar que essas opiniões são infundadas. Ou confirmar seus fundamentos.
Outro ponto crítico no corpo de auxiliares é a ausência de maior representatividade de grupos historicamente sub-representados - mulheres, negros e comunidades indígenas, considerando a diversidade etnocultural de Belém. Embora haja mulheres em cargos importantes, como Cilene Sabino na Secretaria de Turismo e Cultura, cuja experiência na pasta também é questionada, a paridade de gênero ainda está longe de ser plenamente alcançada.
Para Sérgio dos Santos, sociólogo, o Secretariado de Belém apresenta “um perfil promissor”, mas ainda precisa se provar. Para ele, o desafio de equilibrar inovação e experiência “é garantir que as decisões sejam guiadas por critérios técnicos e não apenas políticos ou por simpatia pessoal”. A gestão de Igor Normando terá que demonstrar, segundo ele, que essa equipe é capaz de traduzir suas qualificações em resultados concretos para a população. “Saco vazio não se põe em pé. Se não houver resultado, de nada adiantará a dancinha no TikTok”, alerta o professor.
A dominância de Helder
O governador Helder Barbalho, com sua ampla rede de parentes e aliados em todas as esferas de poder no Estado, desempenhou um papel central no destino das urnas nas eleições da capital em 2024, sequestrando as chances de competitividade de Edmilson Rodrigues, o prefeito claudicante, e fechando o cerco político contra Eder Mauro, o adversário óbvio no segundo turno. A equação deu certo. Mas deixou pendurada uma dívida.
Como se sabe, dívida política não se paga com dinheiro, mas com dependência. Ou traição. A dependência de Igor Normando para com o governador Helder Barbalho é evidente e levanta especulações crescentes nos bastidores, questionando a autonomia política do prefeito, o futuro de seu governo pós-Helder e a dinâmica de poder no Pará.
A eleição de Igor - marcado por uma trajetória política focada na causa animal - levanta questionamentos sobre sua capacidade de gerir uma cidade complexa como Belém. Embora a causa animal seja relevante, ela não oferece, por si só, a experiência administrativa necessária para enfrentar os desafios urbanos, ambientais e sociais, o que reforça a certeza de que sua eleição foi mais um reflexo da influência política de Helder Barbalho do que de sua própria trajetória.
A ausência de Igor em todos os debates eleitorais é a prova cabal de que ele próprio não se sentia preparado para a disputa, que ao fim e ao cabo não foi travada por ele e nenhum dos adversários, mas por Helder e todos eles.
As escolhas de Cássio
Talvez você não lembre, mas a escolha de Cássio Andrade, filho do ex-senador Ademir Andrade, como vice-prefeito na chapa de Igor não foi um parto sem dor. Marcada por tensões públicas, com a disputa entre seu nome e o de Úrsula Vidal, secretária de Cultura do Estado, esse embate revelou a influência aberta de setores conservadores, como a Assembleia de Deus e a Igreja Quadrangular, na formação da chapa governista, sendo decisiva para a indicação de Cássio, evidenciando que sua escolha foi mais um reflexo de alianças políticas do que de um alinhamento com as demandas da população.
Essa celeuma já fragilizou sua posição, tornando-o mais um símbolo de acordos políticos de bastidores do que de representatividade popular. “Na verdade, Cássio Andrade representava soma zero na chapa, porque tem um perfil idêntico ao do candidato que a encabeçava”, afirma o sociólogo Sérgio dos Santos.
Por tudo isso, causou surpresa a decisão do vice-prefeito de Belém, Cássio Andrade, de abandonar o cargo pelo qual tanto lutou, para assumir a Secretaria de Esporte e Lazer. O fato levanta questões críticas sobre o respeito de um político à escolha do eleitor e sobre a dinâmica política que permeia a gestão municipal.
Eleito ao lado de Igor, Cássio tinha a responsabilidade de atuar como um parceiro estratégico na administração municipal, representando os interesses da população que confiou nele para ocupar essa posição. No entanto, sua saída abrupta para um cargo subordinado no governo estadual não apenas enfraquece a administração municipal, mas também é um flagrante desrespeito à vontade popular.
A justificativa de que os conflitos de Cássio com os auxiliares mais próximos do prefeito, especialmente os mais jovens, motivaram sua decisão, revela sua incapacidade de lidar com divergências e de priorizar o bem-estar coletivo.
Essa atitude também reforça a percepção de que a gestão municipal está excessivamente dependente do governo estadual, ao ponto de figuras-chave como Cássio Andrade preferirem se alinhar diretamente ao governador Helder Barbalho, em vez de fortalecer a administração local. “Isso enfraquece a autonomia da prefeitura e mina a confiança da população, que agora se sente traída por um vice-prefeito que abandonou suas responsabilidades”, destacou Dos Santos.
2026 e suas incógnitas
A eleição do próximo ano para o governo do Pará promete ser um divisor de águas no cenário político estadual, com implicações diretas para a administração municipal de Belém.
Apesar do alto índice de aprovação de Helder Barbalho, sua preferência por Hana Ghassan como candidata à sucessão tem gerado dúvidas nos bastidores políticos. Hana, embora reconhecida por sua capacidade técnica e proximidade com o governador, enfrenta desafios de competitividade, especialmente diante do apetite político de Daniel Santos, prefeito de Ananindeua, que desponta como um adversário forte e articulado.
Caso Daniel Santos vença as eleições, a administração municipal de Belém, liderada por Igor Normando, enfrentará um cenário de isolamento. Com apenas dois anos de mandato, a gestão de Igor ainda não terá completado o ciclo de consolidação necessário para se firmar como uma liderança independente. A dependência do suporte político, espectral e administrativo de Helder Barbalho é evidente, e a perda dessa base de apoio deixaria a prefeitura "órfã" em um momento crítico.
Além disso, a falta de autonomia da gestão municipal, já apontada como um ponto fraco, seria ainda mais exposta em um cenário de ruptura política. Sem o respaldo do governo estadual, a administração de Belém teria dificuldades para implementar projetos de grande porte e manter a estabilidade política necessária para governar uma capital tão complexa.
O papel de Daniel
Daniel Santos, prefeito de Ananindeua e liderança mais notória da oposição ao atual governo, tem uma trajetória política ascendente e forte presença na Região Metropolitana de Belém, representando uma ameaça real à hegemonia do MDB no Pará. Sua capacidade de mobilização e articulação política, sua desenvoltura, mesmo com prefeitos aliados a Helder, se associam a um discurso de mudança, podendo atrair eleitores insatisfeitos com o continuísmo representado por Hana Ghassan.
Como se vê, a eleição de 2026 será um teste de fogo para o grupo político liderado por Helder Barbalho. A escolha de Hana Ghassan, embora estratégica para garantir a continuidade do projeto político, enfrenta desafios significativos, sendo um deles ela mesma. Em contrapartida, Daniel Santos surge como uma força disruptiva, capaz de alterar profundamente o cenário político estadual. “Acusar Daniel de bolsonarista ou aludir às denúncias de corrupção de última hora não resolvem o problema de Helder ou de Hana, apenas o agravam. Não é possível ignorar que a única forma de neutralizar esse avanço seria sentar e combinar o jogo com o inimigo. A insistência em bater chapa contra Daniel em 2024 foi um erro. É preciso tirar lições daquele episódio”, diz o consultor da Coluna Olavo Dutra.
Para a administração municipal de Belém, o resultado da eleição de 2026 será determinante: uma vitória de Daniel Santos pode deixar a gestão de Igor Normando em uma posição de extrema vulnerabilidade, comprometendo sua capacidade de governar e de responder às expectativas da população. Há quem aposte, contudo, que até lá os “maristas” mostrarão que não estão mais no recreio do Colégio Nazaré.
Papo Reto
·Entreouvido em uma fila do banco: deveriam auditar o caixa central do Banpará e sua relação com os constantes apagões de sistema O que será que um tem a ver com outro? Resposta com Ruth Mello (foto).
·Conversa puxa conversa: não procede, até onde se sabe, a informação de que o Itaú voltou negociar a compra do Banpará. A auditoria pela qual o banco passa neste momento é considerada regular e necessária.
·Explica-se: necessária porque as “anormalidades ^nas operações do banco têm se tornado repetitivas e sem solução”.
·No caso do Banpará, existem fatos recentes envolvendo diretores e presidente que não foram devidamente esclarecidos.
·Chamava atenção, ontem, no desfile de blocos e escolas de samba de Icoaraci, o maciço visual midiático do governo do Estado que, pelo visto, assumiu de vez o papel da prefeitura.
·O presidente da Fiepa, Alex Carvalho, participa nesta segunda-feira, em Brasília, do lançamento da Sustainable Business COP30, em que a CNI reunirá contribuições do setor produtivo para a agenda climática.
·O evento contará com a participação online do governador Helder Barbalho, além do presidente da CNI, Ricardo Alban e do presidente da COP30, André Corrêa do Lago.