o ocaso de uma gestão onde prevalece a política partidária, profusão de procedimentos administrativos disciplinares para esmagar adversários, favorecimentos, investimentos duvidosos e menos ensino, a Reitoria da UFPA convoca o Conselho Universitário para discutir a criação do Polo Mercedários como órgão suplementar da administração.
Será no próximo dia 1º, a partir das
14h30, no prédio do Instituto de Tecnologia. Não se sabe se o novo reitor,
professor Gilmar Pereira, concorda com a medida. Gilmar será nomeado em 15 dias
- curiosamente, quinze dias antes do término do mandado do atual reitor,
professor Emmanuel Tourinho, em uma surpreendente decisão do Palácio do
Planalto.
Inquietação silenciosa
Ensimesmada sob o tacão da gestão
Tourinho e mesmo tendo emprestado apoio para a eleição do sucessor Gilmar
Pereira, a academia se inquieta. Habituada ao silêncio obsequioso, reclama por
via oblíquas, última tentativa de dizer ‘não’ no apagar das luzes. Costuma-se
dizer por lá, no escurinho dos bastidores, que, a esta altura, “quem está fora
quer entrar, mas quem está dentro não quer sair”, o que pode ser interpretado,
para encurtar conversa, a partir da proposta de criação do Polo Mercedários que
vai ao Consun: a atual gestão faz que vai sair, mas fica lá mesmo. Gilmar
sorri; não fala.
“Primeiro os meus”
Fonte ouvida pela Coluna
Olavo Dutra informa que Emmanuel Tourinho costuma reunir os conselhos
superiores apenas para aprovar matérias do interesse pessoal, tanto que não há
mais discussões e deliberação - nesses conselhos - de matérias de interesse
coletivo e debates dos grandes temas do ensino superior, como antes. “Prevalece
o elitismo e o personalismo do casal que comanda a UFPA”, enfatiza a fonte.
É o que sugere a restauração do
Convento dos Mercedários - e a criação do polo -, na área comercial de Belém,
que passou a jurisdição da UFPA, em 2018. Às vésperas de entregar o cargo, o
reitor investe maciçamente na empreitada. Milhões de recursos já foram
destinados à obra, como ele mesmo reconhece internamente. Mas, nesse caso,
Tourinho não consultou os órgãos colegiados superiores da UFPA, como deveria
ser feito, “porque tudo é realizado na surdina”, diz a fonte.
Côncavo e convexo
O Complexo Mercedários de Belém é
composto pela igreja das Mercês e pelo antigo convento, cuja construção teve
início em 1640 e foi refeita a partir de 1748, após um grande incêndio. A
igreja é um dos maiores e mais importantes conventos coloniais da Região
Amazônica e constitui um dos quatro exemplares de fachadas com perfil côncavo
existentes no País.
Após a sua desativação, o convento foi incorporado ao patrimônio da
União, tendo recebido atividades variadas. O espaço foi cedido à UFPA pela
Secretaria do Patrimônio da União (SPU), em março de 2018.
No dia 9 de abril de 2018, houve a
assinatura do contrato de cessão à UFPA. No dia 26 de outubro do mesmo ano, foi
aprovada a criação do curso de graduação em Conservação e Restauro e
do Mestrado em Ciências do Patrimônio, que iniciaram as atividades em
março de 2019.
Para o início dessas atividades, a
UFPA investiu em recursos próprios em torno de R$ 15 milhões e captou cerca de
R$ 3,5 milhões em editais públicos para o financiamento de projetos.
“Daqui não saio”
“Milhões de recursos já foram
direcionados para adquirir equipamentos e executar obras no Mercedários,
enquanto para as unidades acadêmicas, responsáveis pelas atividades de ensino,
pesquisa e extensão - e precisam manter laboratórios, prédios administrativos e
salas de aula -, pouquíssimos recursos foram disponibilizados”, esclarece a
fonte.
“Mármore da melhor qualidade e
equipamentos dos mais sofisticados foram adquiridos para o Mercedários”, fato
confirmado por um diretor da Reitoria que tem por função controlar os bens
patrimoniais da UFPA. “A suposição é de que no secular prédio está sendo
construído o futuro escritório de representação de Tourinho”, acrescenta.
Casal poderoso
Outra fonte ligada à Universidade
corrobora a primeira e dá nomes: “Prevalece o elitismo e o personalismo do
casal que comanda a UFPA”. O casal em questão é o reitor Emmanuel Tourinho e a
mulher dele, Simone Neno, que estão à frente do projeto do Mercedários e de uma
editora.
“Os dois projetos têm egos
faraônicos, mas, na UFPA e seus campi, a precariedade das salas de aulas e dos
laboratórios prevalece”, prossegue a fonte. “O teto do laboratório de curso de
Farmácia, por exemplo, está prestes a desabar, mas há outros laboratórios
sucateados, com exceção daqueles dos 'amigos da realeza'; prédios
administrativos estão sem manutenção e as vias do campus, esburacadas”, relata.
Pessoas que trabalham nas obras do
Mercedários dizem que é marcante a diferença entre itens para o projeto, quando
se compara a outros da UFPA, como poltronas, banheiros e vidraria. “Um
escândalo que é comentado com frequência, para espanto na comunidade acadêmica”,
enfatiza.
Obra faraônica
O restauro do Complexo dos
Mercedários inclui a igreja anexa. Em 4 de outubro de 2023, foi assinado o
repasse em doação do BNDES de R$ 36,3 milhões para as obras, com contrapartida
da UFPA, chegando ao orçamento total de R$ 49,4 milhões.
A pergunta que se faz nos corredores
do campus do Guamá é: “Onde esse elitismo investe e com qual interesse? De onde
virá essa contrapartida da instituição e quem foi ouvido na comunidade?”
Na assinatura do protocolo estavam
representantes da UFPA, do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social
(BNDES), da Fundação de Amparo e Desenvolvimento da Pesquisa (Fapesp) e da
Arquidiocese de Belém, que assinaram o contrato de financiamento do chamado
Projeto Cultural de Restauro e Reabilitação do Complexo dos Mercedários. A
cerimônia teve também a presença do governador Helder Barbalho, do prefeito
Edmilson Rodrigues, e do presidente do BNDES, Aloizio Mercadante. O
projeto da UFPA é ainda apoiado pelo Instituto Cultural Vale e, para isso, foi
assinado um memorando de entendimento, com a interveniência da Fadesp, Fundação de Apoio da
UFPA.
Editora e cinema
A área que vai abrigar outras
atividades que não as acadêmicas e científicas, no Mercedários, terá a Galeria
de Arte da UFPA, o Museu de Ciências do Patrimônio Cultural, um projeto de
ensino da Escola de Música da UFPA, um novo auditório para 175 pessoas e um
espaço expositivo para atividades relacionadas à vocação do ambiente.
“Castelo da Rainha”
Se o projeto Mercedários já se
constitui um “escândalo”, conforme avaliam as fontes da coluna, a construção da
nova sede da editora da UFPA e de uma sala de cinema, em áreas no campus da
UFPA, não fica atrás.
Simone Neno está à frente desses dois projetos, o que já rendeu ao
espaço o título de “Castelo da Rainha”. Simone Neno deve ser nomeada pelo
magnífico reitor Gilmar Pereira diretora desses espaços, mas há divergências.