Mulheres afegãs criam clube de leitura secreto e desafiam o regime do Talibã

Após o fechamento da biblioteca e a interrupção das manifestações públicas, advogada lançou clube de leitura online via WhatsApp e Telegram

16/08/2025, 19:00
Mulheres afegãs criam clube de leitura secreto e desafiam o regime do Talibã

São Paulo, SP - A repressão aos direitos das mulheres se intensificou desde que os talibãs retomaram o poder no Afeganistão. As meninas foram proibidas de frequentar escolas secundárias e universidades, enquanto as afegãs enfrentam restrições severas ao acesso ao trabalho, parques públicos e até mesmo bibliotecas.


A obrigatoriedade de serem acompanhadas por um mahram (um parente do sexo masculino) para viajar e o último decreto que proíbe que falem em público exemplificam o estado crítico da situação.


Dentre as que desafiaram essas regras estão mulheres que organizaram manifestações ou fizeram perguntas públicas, muitas das quais foram presas e relataram torturas e abusos sexuais durante o encarceramento.


A ideologia talibã também se estende aos livros. Bibliotecas públicas em Cabul e Herat tiveram obras confiscadas por conterem temas considerados controversos. Mulheres que tentam ler ou estudar secretamente enfrentam represálias severas.


O inspetor de bibliotecas talibã, Zalmai Forotan, afirmou que livros com conteúdos que contrariam a visão talibã são rigorosamente examinados e removidos das estantes.Embora inicialmente os talibãs tenham prometido que as restrições seriam temporárias, as limitações tornaram-se cada vez mais rigorosas. As mulheres agora navegam por um labirinto de proibições que regem aspectos fundamentais de suas vidas.


Redes de Resistência


Apesar do crescente controle sobre os espaços femininos, algumas mulheres têm encontrado maneiras criativas de contornar essa opressão. Após o fechamento da biblioteca e a interrupção das manifestações públicas, Fahr Parsi, uma advogada afegã de 29 anos, lançou um clube de leitura online via WhatsApp e Telegram.


“Cerca de 300 mulheres se juntaram ao nosso grupo no WhatsApp, onde compartilho arquivos PDF dos nossos livros”. Ela também empresta cópias impressas a colegas confiáveis.A troca de ideias acontece com cuidado extremo; as participantes se comunicam sobre suas leituras através de fotos. As reuniões clandestinas ocorrem apenas com algumas associadas em quem confiam totalmente. “Tememos que haja espiões entre nós”, revelou Parsi.


O processo de seleção para novos membros é rigoroso; cada nova participante é examinada pessoalmente antes de ser aceita no grupo. A pressão aumenta com os registros porta a porta realizados pelos talibãs em busca de dissidentes como o Frente Nacional de Resistência (FRN) e o ISIS-K, levando Parsi a ocultar sua coleção como se fosse contrabando.


A demanda por literatura continua crescendo entre as mulheres afegãs; elas buscam inspiração em meio a um futuro incerto. Recentemente, o grupo leu “Sinuhé, o egípcio”, obra que aborda temas como repressão e perda da identidade.


Suporte do exílio


Enquanto Parsi corre riscos dentro do Afeganistão, outras mulheres afegãs no exílio têm criado redes para apoiar aquelas que permanecem no país. Na Alemanha, Maryam Amwaj coordena um grupo no Telegram com mulheres europeias para organizar círculos de leitura para meninas no oeste do Afeganistão.


Amwaj declarou: “É o mínimo que podemos fazer por nossas irmãs no país para lutar contra essa crescente escuridão”.


Shahrbanu Haidari, defensora dos direitos das mulheres afegãs vivendo no Reino Unido, enfatizou que esses clubes são uma forma significativa de resistência emergente entre as mulheres afegãs. Ela afirma: “Elas não desistiram; apenas mudaram suas estratégias”.


Foto: Divulgação

(Com O Antagonista)

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