Marina é da Amazônia e faz tempo que, como líder socioambiental, ultrapassou os limites geográficos e geopolíticos do Brasil.
Um navio cargueiro transporta minério extraído da Amazônia através do rio Amazonas, o maior do mundo em volume de águas. O fotógrafo João Ramid fez este registro raro em uma expedição de ultraleve na floresta. “Foi a primeira vez na história da Amazônia que aconteceu um sobrevoo rasante fotográfico na altura do voo dos pássaros, saindo de Belém até o município de Juruti, na divisa do Pará com o Amazonas”, conta Ramid.
“Eu quis mostrar a beleza da imensidão do rio e, de repente, apareceu o navio levando riquezas retiradas da Amazônia”, revela João Ramid, que sempre focou o seu trabalho em registrar o belo da maior floresta tropical do mundo. Porém, no meio do caminho, o artista encontra frequentemente a degradação ambiental e social presente na região.
As atividades de extração ainda são predominantes na Amazônia, em contraponto com as produções sustentáveis, a partir das populações tradicionais locais. Estas ainda têm volume pequeno e carecem de incentivos.
Nesta edição a Ver Amazônia mostra em vídeo um exemplo de produção local de bioeconomia, que gera renda para o povo da floresta em harmonia com o meio ambiente. Assista, acima, ao vídeo que tem direção de Wilson Paz.
Muito além de biografia
O tema desta semana foi inspirado na imagem do navio cargueiro no Amazonas e nas palavras de uma mulher. Passei mais de uma hora escutando a ministra do Meio Ambiente e Mudanças do Clima do Brasil, Marina Silva, em sua passagem por Belém, durante a 76º Reunião Anual da Sociedade Brasileiras para o Progresso da Ciência.
A ministra é feita de simplicidade, nasceu na Amazônia, no Acre, trabalhou ao lado de Chico Mendes, um líder símbolo da luta pela preservação da floresta. Seringueira, professora de história e tornou-se ministra de Estado, entre tantos outros cargos políticos que ocupou. Ela tem muito a dizer e a fazer. Tem propriedade na fala e coerência na expressão. Marina é da Amazônia e faz tempo que, como líder socioambiental, ultrapassou os limites geográficos e geopolíticos do Brasil.
A ministra professora é reconhecida e respeitada nos palcos e bastidores internacionais, inclusive nas plenárias onde os principais países mais ricos e mais poluidores do planeta buscam correr atrás dos prejuízos da negação histórica das alterações climáticas. Negaram ou “empurraram com a barriga” o que estava por vir. Hoje a crise climática está em curso em velocidade que assombra o mundo.
Marina Silva já entrou na seleta lista do jornal The Guardian entre as cinquenta pessoas que podem salvar o planeta, e muitos outros prêmios recebidos pela sua atuação na Amazônia e pelo o meio ambiente. Mas, não é sobre a biografia da ministra que queremos falar nesta edição.
Qual a relação de Marina que nasceu na floresta, a Amazônia e a crise climática? Primeiro olhar: para entender a Amazônia tem que ir além da teoria. Somos ambiental e social. Somos conhecimento tradicional e ancestral, portanto somos “sóciobio”. A Pan-Amazônia (Brasil Peru, Bolívia, Equador, Venezuela, Colômbia) tem cerca de 47 milhões de habitantes. Aproximadamente 29 milhões de pessoas somente no Brasil, nos nove Estados que compõem a região na parte brasileira, de acordo o IBGE.
Segundo olhar: as pessoas que moram na Amazônia enfrentam vulnerabilidades sociais e pobreza, com dificuldades de acesso aos serviços básicos de saúde e educação, por exemplo. Além dos altos índices de insegurança alimentar, fome ou insuficiência de alimentos. Dados da Fiocruz sobre os Índices de Desenvolvimento Humano Municipal (IDH-M) e a renda Per Capita mostram que a Amazônia ainda é uma das regiões mais pobres do Brasil. Como é possível isso acontecer em um pedaço do planeta que tem a maior biodiversidade do mundo?
Terceiro olhar: a Amazônia começa a ser afetadas pelas alterações climáticas. Cheias e secas, que sempre ocorreram nos ciclos históricos, transformaram-se em ameaças e riscos para a vida dos povos da região. As populações da floresta perdem suas fontes de sobrevivência, como a pesca, a agricultura e o bem viver que a biodiversidade amazônica oferece. Com as secas e enchentes tudo fica mais grave.
Na roda dos importantes pensadores e cientistas do Brasil, na SBPC, Marisa analisou o atual estágio do planeta em tempos de alterações climáticas. A ministra ressaltou a importância da ciência na constatação e alerta acerca do aquecimento do planeta e dos riscos climáticos a partir das interferências humanas. Ela pediu licença aos pesquisadores para falar com a voz de quem carrega a experiência de vida na floresta e percebe bem os movimentos que levaram o planeta a esta situação hoje.
“Humildemente eu não sou cientista, então peço data vênia, para a liberdade científica, porque não estando no lugar do rigor científico eu posso tangenciar um pouco”. A ministra que nasceu e cresceu na Amazônia, disse que as pessoas aprenderam a olhar apenas as regularidades cósmicas, quando é inverso, primavera, dia e noite. “Aí de repente, a gente altera certos processos e imagina que isso não tenha consequência”, analisa.
Marina Silva lembra que “durante a Revolução Francesa nós éramos 1 bilhão de pessoas no planeta terra. Aquelas três palavras, igualdade, liberdade e fraternidade, nos fezeram avançar substituindo as monarquias pelas democracias. Saímos de 1 bilhão de seres humanos para a quantidade de pessoas que somos hoje (mais de 8 bilhões no planeta)”, diz a ministra.
“Nós não teríamos como fazer isso sem o avanço da ciência, sem o avanço da tecnologia, sem o avanço do conhecimento”. Conseguimos fazer com que, sobretudo a partir da Revolução Industrial, a gente fosse capaz de produzir energia para a quantidade de pessoas que temos hoje, com ganhos e com dificuldades.
Mas, a mesma energia criada para mover as indústrias, as cidades e a vida moderna consome a natureza de forma arcaica até hoje. O mundo, principalmente nos países mais ricos e industrializados, ainda depende do gás, do carvão e do petróleo. São os combustíveis fósseis altamente poluidores.
Marina Silva cita como uma das maiores dificuldades os processos de desigualdades em torno das formas de apropriação dos bens que a natureza oferece. “Os recursos naturais são apropriados, transformados em dinheiro e os prejuízos são compartilhados por muitos, principalmente os mais vulneráveis”, analisa a ministra.
A ação humana sem os cuidados é capaz de não só destruir a nossa vida, mas, as condições em que a vida nos foi dada. “Já estamos vivendo sob os efeitos da mudança do clima, os efeitos dos eventos extremos, é só olhar o que está acontecendo em vários lugares do mundo e no nosso próprio país”, afirma. A ministra referiu-se também a ultrapassagem dos limites de temperatura estabelecidos em 2015, na COP de Paris.
A ONU divulgou que estamos há 12 meses consecutivos, incluindo o mês de junho de 2024, atingindo a temperatura média global de 1,5°C, acima da era pé industrial. Segundo a Organização Meteorológica Mundial, OMM, é o 13º mês consecutivo a estabelecer um recorde mensal de temperatura. Estamos ultrapassando os primeiros limites do Acordo de Paris.
“Não é mais uma teoria de cientista, não é mais um alerta dos ambientalistas, agora é a realidade. Nós todos temos que dar a resposta a altura do risco”, alerta a ministra. Marina Silva afirma que a COP 30, em Belém, terá que ter metas ambiciosas a altura de fazer com que o ponteiro do clima que ultrapassou os limites de segurança do Acordo de Paris, possa rescindir e estabilizar.
A Amazônia, que sempre foi vista como solução, muitas vezes de forma equivocada, volta ao centro da questão em um momento crucial. A COP 30 carrega as responsabilidades de buscar um novo rumo e uma virada no sentido das coisas. Serão 195 países com representatividades dos governos e da sociedade civil na cidade de Belém, em um momento de crise climática ativada. Não será tarefa simples. O cargueiro que leva minério pelo rio Amazonas não é o único e não será o último. A crise climática segue a cada dia mais severa.
Mas, a COP da Amazônia promete ser uma das mais significativas depois do Acordo de Pará, em 2015. Mesmo com a degradação socioambiental que ocorre na floresta, a Amazônia continua sendo equilíbrio neste planeta mexido e adoecido. Marina Silva está no momento certo da história. Como liderança socioambiental nascida da floresta, tem lugar de fala e o poder de mobilização.
Finalizamos com as perguntas que nortearão o tema da próxima edição da Ver Amazônia. Somos mais de 8 bilhões de pessoas no planeta. Quem de fato se importa com a crise climática?
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Mobilização
O governo brasileiro pretende mobilizar a sociedade em torno da questão climática, através da plataforma Brasil Participativo. O ministro chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Márcio Macêdo, anunciou que serão realizadas plenárias participativas nos seis biomas brasileiros e em Brasília. O governo quer construir um novo plano climático do Brasil com participação popular. Mas, além das consultas usando a tecnologia e a internet, não está claro como será feita a mobilização e o envolvimento das pessoas. Vamos acompanhar.
Amazônia em Natal
Jornalistas da Amazônia, onde ocorrerá a COP 30, estarão na cidade de Natal, no Rio Grande do Norte, no período de 1 a 3 de agosto. O grupo irá participar do I Encontro Nacional Febtur de Jornalistas e Comunicadores de Turismo. O tema será “Fronteiras Digitais: explorando novas dimensões no jornalismo de turismo. Os jornalistas da Amazônia pretendem também propor que o próximo congresso da FEBTUR, em 2025, ocorra em Belém, a capital da COP 30.
Ver o Rio Grande do Norte
O evento vai reunir profissionais de turismo do Brasil, do Uruguai e da Argentina. Mais de 100 jornalistas e comunicadores de turismo são esperados. Na programação, palestras e debates sobre a comunicação para o turismo e visitas técnicas aos pontos turísticos do Rio Grande do Norte. A Ver Amazônia vai participar do evento, que terá também a participação do jornalista, escritor e comentarista da Globo News, Fernando Gabeira. O encontro é organizado pela Febtur /RN e a Febtur/nacional.
Gestão de desastres
A partir dos últimos eventos extremos que abalaram o Brasil, como a enchente do Rio Grande do Sul, o tema gestão de desastres entrou na pauta do governo brasileiro. Uma equipe interministerial já entregou ao presidente Lula a primeira versão do plano brasileiro de gestão para eventos climáticos extremos. No pais, 1030 municípios estão suscetíveis aos eventos extremos. A ministra Marina Silva defende que nesses municípios seja decretada a emergência de forma permanente através de um novo marco regulatório.
Jornalista, natural de Belterra, oeste do Pará, com 48 anos de profissão e passagens pelos jornais A Província do Pará, Diário do Pará e O Liberal.
Comentários
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