Salvaterra, Marajó, 63 anos: muito empolgado, prefeito lança pergunta "quem cheirou bacana?"

Escândalo: Valentim Oliveira, do MDB, usa e abusa de palavras de baixo calão em cerimônia pública ao se dirigir à população do município e deixa um cheiro ruim no ar.

14/03/2025, 11:40

Câmara de Vereadores faz que não vê, mas comportamento do prefeito Valentim Oliveira está sujeito a regras de decoro/Fotos: Divulgação-Redes Sociais.


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erou grande repercussão a postura de apologia ao uso de drogas do prefeito de Salvaterra, Valentim Oliveira, do MDB, no aniversário de 63 anos da cidade. Em pleno palanque de uma atração musical, o prefeito deu um show de horrores. Do alto, além de perguntar ao distinto público “Quem aqui cheirou bacana?”, o prefeito abusou de palavras de baixo calão ao berrar “Salvaterra, 63 anos, a princesa do Marajó, p...”. O palavrão, por que pareça usual, não cabe no decoro político.

Rigorosamente, poderia ter sido um momento para o prefeito agradecer pelo milagre operado pelo Tribunal de Contas do Estado que lhe permitiu concorrer - e ganhar - na última eleição municipal, e dizer simplesmente: “Ainda estou aqui...”

Palavrões é o que menos se espera de um servidor público, mas Valentim Oliveira, ao se pronunciar, parecia bastante alterado, não se sabe se por algo que não lhe caiu. “O prefeito não pode tratar a cidade como o quintal da casa dele. Não é porque os votos são para ele que o cargo é dele. O cargo é público, e se o prefeito não honrar a legislação, merece ser punido”, avalia uma fonte jurídica consultada pela Coluna Olavo Dutra.

Câmara se faz de morta

Segundo a fonte, no Brasil, a conduta do prefeito deve estar de acordo com os princípios da moralidade e do decoro, conforme previsto na Constituição Federal, na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429/1992), no Decreto-Lei nº 201/1967, que trata dos crimes de responsabilidade dos prefeitos, e ainda na Lei Orgânica do Município. “Todos os municípios em suas leis orgânicas devem seguir os princípios básicos da Constituição, e isso inclui os que regem o que chamamos de decoro. E quem fiscaliza isso? Ora, o primeiro a fazê-lo deve ser a Câmara de Vereadores, que tem como função primária fiscalizar os atos do Executivo. Quando um prefeito ocupa um palanque representando a cidade, está no exercício da função, não importa a hora e o local”, adverte.

A fonte lembra, por exemplo, que o Decreto-Lei nº 201/1967 coloca a falta de coro no mesmo âmbito dos crimes de responsabilidade cometidos por prefeitos. “O artigo 4º menciona que o prefeito pode perder o cargo caso pratique atos incompatíveis com a dignidade e o decoro do cargo, por exemplo, mas cada município, em sua Lei Orgânica, deve detalhar as condutas inadequadas e prever sanções específicas para falta de decoro, e a Câmara pode e principalmente deve fazer essa fiscalização e cobrança”, alerta a fonte, mas até o momento a Câmara de Salvaterra se finge de morta.

Cheira a favorecimento

Enquanto tenta animar a população com pão e circo, mas sem nenhum decoro pelo cargo, uma liderança comunitária de Salvaterra diz que a administração do prefeito deixa muito a desejar. Valentim, aliás, foi eleito com uma candidatura validada pela Justiça Eleitoral graças a favores do Tribunal de Contas do Estado do Pará (TCE) que, em decisão inédita, deu uma espécie de abono às contas reprovadas de exercícios anteriores de Valentim e permitiu que na eleição do ano passado o então ex-prefeito pudesse manter a candidatura que o fez vencer o prefeito Carlos Alberto Santos Gomes, do PSD, o “Seu Carlos”, que tentava a reeleição.

Com as bênçãos da Corte de Contas, Valentim não apenas concorreu como derrotou, “Seu Carlos” pelo placar de 52,52 % contra 42,17 %.

À época, a controvérsia divulgada com exclusividade pela coluna envolveu a rescisão do Acórdão n.º 62.224, com relatoria do conselheiro Odilon Coutinho, que havia condenado Valentim por irregularidades em suas contas, impondo devoluções e multas. A decisão foi rescindida pouco antes das eleições do ano passado, sob alegação de prescrição, e permitiu ao ex-prefeito obter a quitação eleitoral, certidão obrigatória para concorrer às eleições.

A tal coisa julgada

O Acórdão n.º 62.224, que transitou em julgado em fevereiro de 2022, considerou irregulares as contas de Valentim, determinando a devolução de R$ 66.967,00 e a aplicação de multas. Mesmo assim, o TCE deliberou pela rescisão do acórdão com base na prescrição, contrariando dispositivos constitucionais que garantem a imutabilidade da coisa julgada e afrontando o seu próprio regimento interno, que impede a aplicação retroativa da prescrição em decisões já transitadas.

Antes de entregar o cargo, “Seu Carlos” apresentou uma reclamação formal ao Ministério Público de Contas - mero órgão auxiliar do TCE com pinta de independência -, já que a rescisão violava frontalmente inclusive a própria Constituição Federal, que em seu art. 5º, inciso XXXVI, assegura a proteção à coisa julgada. Ele argumentou que a decisão beneficiou injustamente Valentim e comprometeu a segurança jurídica e a moralidade administrativa.

Contradição gritante

O caso também expôs uma contradição gritante nas decisões do próprio TCE. Em situações semelhantes, a Corte rejeitou a aplicação da prescrição em processos já transitados em julgado, como demonstra o Acórdão n.º 67.206, que reforça: “O reconhecimento da prescrição não deve atingir processos já transitados em julgado”. Essa postura também encontra respaldo no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que considera inadmissível a alegação de prescrição após o trânsito em julgado, conforme decisão no Resp. 1819410/MG.

Como diz a boa fonte jurídica da coluna, foi uma decisão seletiva em favor que evidencia um tratamento desigual em casos idênticos, onde pedidos da mesma natureza já foram considerados extemporâneos, mas, naqueles casos, envolvendo outros partidos que não o MDB, houve a correta aplicação das leis.

Pergunta e resposta

O MPC respondeu à ação do ex-prefeito? Mas quando já!

Papo Reto

·Acometido de miocardite, o meia paraense Paulo Henrique Ganso (foto), do Fluminense, fará novo procedimento médico e só retornará aos gramados a partir da segunda rodada do Brasileirão.

·Semanas atrás, a Uepa alardeou na internet um processo seletivo online para um curso de extensão em inglês - voltado ao público que pretende atuar na COP 30.

·A coluna ouviu vários jovens que tentaram se inscrever e todos, unanimemente, relataram que sequer conseguiram acessar o sistema da Uepa, muito menos obtiveram retorno no e-mail indicado pela instituição para relato de dificuldades no acesso ou mesmo geração do boleto de matrícula.

·Diz um servidor da Universidade do Pará que "o certame foi anunciado apenas para legitimar a distribuição das vagas, todas direcionadas a apaniguados políticos".

·Tensão e violência devem tomar conta do campo no Brasil: militantes do MST começaram promover - com aval do governo, claro -, invasões e protestos em todas as regiões do País, como parte da "Jornada Nacional de Luta das Mulheres Sem Terra".

·No sudeste do Pará, os invasores dizem abertamente que foram “autorizados” pela Superintendência do Incra em Marabá.

·Depois de meses trabalhando de graça, o empresário Edinho do Frigoboi resolveu fazer um protesto pacífico, estacionando suas máquinas na porta da casa do prefeito de Santana do Araguaia, Eduardo da Machado, do MDB. 

·Os juros médios cobrados pelos bancos em janeiro chegam a 42,3% ao ano, diz o Banco Central. 

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