Prefeitura de Belém garante que não haverá aumento da tarifa de iluminação pública e nem alteração na alíquota da Contribuição de Iluminação Pública, a Cosip. “Os consumidores de Belém podem ficar tranquilos, pois são totalmente inverídicas quaisquer afirmações de reajuste”. Em nota a prefeitura parece sugerir que o entendimento de vereadores sobre o projeto está equivocado, embora confirmado por especialista em questões tributárias.
Segundo a prefeitura, em obediência
ao que determina a Emenda Constitucional 132/2023, o Executivo enviou à Câmara,
no dia 12 de abril, projeto de lei que visa reproduzir no Código Tributário de
Belém a recente mudança da Constituição Federal em relação à Contribuição de
Iluminação Pública. Antes, a arrecadação somente podia ser aplicada no custeio
do serviço da iluminação pública, mas, com a alteração, o recurso poderá ser
aplicado também na expansão e melhoria do referido serviço, bem como de
sistemas de monitoramento para segurança e preservação de logradouros.
De R$ 16, 18 para R$ 61,11
Sobre a correção monetária da base de
cálculo do metro linear do terreno para a cobrança da Contribuição, que, pelo
que consta no projeto, passa de R$ 16,18 para R$ 61,11, a prefeitura explica
que o valor inicial era praticado no ano de 2019, e que o segundo valor já está
sendo praticado no exercício de 2024, pois, todos os anos, o valor é corrigido
pelo IPCA.
Outro ponto de que trata o projeto
são as novas obrigações da concessionária de energia elétrica em relação à
arrecadação da Contribuição. Hoje, ela é arrecadada de duas formas: nos boletos
de conta de consumo e, nos casos de terrenos sem edificação, nos boletos do
IPTU. A Prefeitura de Belém, seguindo a tendência de outros municípios
brasileiros, veio disciplinar e determinar a responsabilidade tributária da
concessionária de energia elétrica na arrecadação da Contribuição.
A informação da Prefeitura de Belém
destaca que a proposta obedece às resoluções da Aneel quando determina a tarifa
B4a - classe de iluminação pública - para o contribuinte, assim como obedece à
concessão de isenção ao contribuinte classificado como de baixa renda, com
faixa de consumo mensal de até 79 Kwh.
Especialista em tributação
interpreta projeto, aponta
falta de transparência
e confirma majoração
Consultado em meio à polêmica gerada pela
proposta da prefeitura, o coordenador do Instituto Brasileiro de Estudos
Tributários em Belém, Fernando Gomes Favacho (foto) - doutor e
mestre pela PUC-SP, e conselheiro Administrativo de Recursos Fiscais
Federal, oferece um esclarecimento diferente sobre o caso. Veja.
O projeto de lei que dispõe sobre a
Contribuição para Custeio do Serviço de Iluminação Pública no município de
Belém pede para adequar a Legislação Tributária Municipal às alterações
previstas na Reforma Tributária (Emenda Constitucional 132/2023).
Atualmente, a CF prevê no art. 149-A
a COSIP (os municípios e o Distrito Federal poderão instituir contribuição,
na forma das respectivas leis, para o custeio do serviço de iluminação pública), graças à Emenda Constitucional n. 39/2002.
O tema dos gastos da Cosip com outros
dispêndios que não a iluminação pública foi encerrada no STF com o Tema 696,0
com trânsito em julgado em 15/09/2020. É constitucional a aplicação dos
recursos arrecadados por meio de contribuição para o custeio da iluminação
pública na expansão e aprimoramento da rede.
A disposição de que o tributo
constante no art. 149-A da CF pode ser utilizado para o financiamento de
sistemas de monitoramento e segurança e para a preservação de logradouros
públicos de fato já é prevista pela Constituição, que amplia o já decidido pelo
Supremo Tribunal Federal. Quanto à destinação, a proposta está correta.
Incidência e aumento
A Cosip de Belém possui duas
hipóteses tributárias - e nenhuma delas “tem como fato gerador a prestação do
serviço de iluminação”, como diz o art. 2º). De fato, paga-se CIP mesmo que não haja iluminação, dado que é contribuição e não taxa.
Os fatos geradores estão no art. 4º,
I (possuir ligação regular e privada ao sistema de fornecimento de
energia elétrica) e II (ser proprietário de imóvel urbano que não
possua a ligação de energia). Paga quem possui conta de luz - com base na
tarifa. E quem não possui paga com a metragem do imóvel.
Quanto a segunda hipótese, possível
de acontecer em loteamentos de condomínio, por exemplo, pouco difere de um
aumento no valor do IPTU: a alíquota é de 15% (art. 6º, II, e art. 8º, II do
Projeto, também constante na Lei anterior), multiplicada por metro linear, no
valor de R$ 61,11 cada.
A Mensagem n. 012/2024 deixa claro
que “O projeto de lei visa a readaptação desta municipalidade ao novo momento
histórico, inclusive revogando a Lei Municipal nº 8.226, de 30 de dezembro de
2002”. Ora, se haverá revogação da lei, obviamente a nova
Cosip será instituída. É o que diz o art. 19 do PL.
Todavia, ainda que não se entenda
haver criação de tributo, a CF fala em “instituiu ou aumentou”, e o aumento é
vedado pelo art. 150, III, “b”. iz a Constituição Federal:
Art. 150. Sem prejuízo de outras
garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao
Distrito Federal e aos municípios:
III - cobrar tributos:
b) no mesmo exercício financeiro em que haja sido
publicada a lei que os instituiu ou aumentou; (Vide
Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
A Constituição fala em cobrança de
tributos, independente se está ou não introduzindo nova espécie ou alterando a
forma ou cálculo da tributação. O único “aumento” permitido é a correção
monetária, justamente porque propriamente não se trata de aumento, e isso
quando há lei anterior regulando a atualização.
Observando a lei anterior (Lei 8.226,
de 2002, inclusive sancionada pelo prefeito atual), diz-se no art. 5º: Art. 5º Os
valores monetários a que se refere o § 2º do art.
3º desta lei serão atualizados anualmente, utilizando-se para isso a variação
registrada no Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E), divulgado
pelo IBGE, nos termos da Lei Municipal nº 8.033, de 29 de dezembro de 2000.
Se esses valores não foram atualizados,
qualquer lei que pretenda reajustar (ainda que somente agora) deverá valer
somente para o ano que vem (2025), dado que a não atualização anual
desobedeceria a própria Lei Municipal 8.033/2000, que exige que a atualização
seja anual - lei esta que é citada, inclusive, no projeto ora analisado.
Art. 2º. Todo e qualquer valor
decorrente da legislação municipal convertido em moeda corrente, em
conformidade com o caput do artigo anterior desta lei, será atualizado
anualmente com base na variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo -
IPCA-E.
Finalmente, não
cabe regime de urgência em se tratando de princípio constitucional
(princípio da anterioridade tributária, que remonta à própria criação da Carta
Magna, é um princípio quase milenar, evitando a surpresa do contribuinte. Ao menos para os proprietários de imóveis urbanos
que não possuem ligação de energia, o aumento de energia é ilegal (vide o
Código Tributário Nacional) e inconstitucional.
Transparência e legalidade
Quanto a faixa de consumo, em relação à lei anterior:
A faixa residencial vigente vai de
79kwh (isento) a acima de 1.000 (alíquota de 25,88%). A Comercial, de 30kwh
(1,29%) a acima de 1.000 (51,78%). Finalmente, a Industrial até 30kwh (20,70%)
a acima de 1.000kwh (116,50%) e a Industrial/Comercial, de 2.000 (133,97%) a
acima de 30.000kwh (441,39%).
A lei proposta mantém a faixa de
consumo isenta de 79kwh, sem discriminar comercial e industrial (apenas chama
de “o contribuinte, classificado como de baixa renda”, sem se referir
exatamente ao que é - art. 12, III do Projeto).
Já a base é mudada para a “subclasse
B4a”, a ser reajustada anualmente utilizando os mesmos parâmetros estabelecidos
pela Aneel, sem discriminar quais são as faixas de tributação. Aqui, além do
provável aumento de valores (o que pode ocorrer tanto com aumento da alíquota
como com aumento da base), há a falta de transparência.
Finalmente, há a possibilidade de se
estar ferindo o princípio da legalidade, posto que o enquadramento por kwh era
oriundo de lei e agora há uma delegação para uma agência externa - não há, na
Aneel, tabela semelhante para efeitos de Cosip como há na lei atual. Basta
olhar a Resolução Normativa Aneel n. 1.000, de 07/12/2021, que estabelece as
regras de prestação de energia elétrica (ren20211000.pdf
(aneel.gov.br). Ao contrário do que diz a mensagem, há clara
alteração da forma de cálculo da contribuição.
Aumento real e ilegal
a) a alíquota está sendo majorada
ilegalmente para quem for proprietário de imóvel sem energia elétrica. Dado o
princípio da anterioridade, o aumento só poderá valer para 2025.
b) a alíquota possivelmente está
sendo majorada ilegalmente para quem for consumidor de energia elétrica, dada a
mudança de critérios (da tabela veiculada por Lei para a “subclasse B4a da
Aneel”. No caso, há possível desrespeito à anterioridade, legalidade e
transparência.