Amazônia não tem representantes no grupo que irá discutir pauta preliminar da COP30

Em meio à polêmica sobre a ausência da UFPA na organização do evento, a Conferência ainda não tem presidente escolhido, mas sabe-se que “família COP” soma 7 mil integrantes.

20/01/2025, 08:30
Amazônia não tem representantes no grupo que irá discutir pauta preliminar da COP30

 

A escolha de Belém como sede da COP 30 ainda deve dar muito pano para as mangas. Nesta semana, precisamente, na quinta-feira, 16, haveria uma reunião em Brasília para decidir o nome do presidente da Conferência em Belém. Esse nome precisa ser de comum acordo entre o País que sedia a COP, o Brasil, e a ONU, que promove o evento. O problema é que tinha a revogação da taxação do PIX, na quarta-feira, e uma grande crise no meio do caminho e até o momento, não se sabe quem será o ‘todo poderoso’. 

 

Intercorrências políticas, como a crise do PIX, adiaram o andamento da programação do evento que vem sendo criticado por pesquisadores da região/Fotos: Divulgação.

De acordo com estimativas da Fundação Getúlio Vargas (FGV), é esperado um fluxo de mais de 40 mil visitantes durante os principais dias da Conferência, que são dos dias em que há a presença dos chefes de Estado, que é sempre na primeira semana, de um total de duas, que é a duração do evento. Deste total, aproximadamente 7 mil compõem a chamada "família COP", formada pelas equipes da ONU e delegações de países membros. 

 

Muitos entraves  

 

Outro problema - que já era previsto, aliás, mas nenhuma instituição tomou à frente, antes - é a ausência de entidades da Amazônia em grupos de trabalho que irão discutir preliminarmente a pauta na COP30. A escolha da Fundação Getúlio Vargas e da Universidade de São Paulo para planejar e organizar a Conferência está sendo contestada por pesquisadores da região.  

 

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“Esse é mais um caso de colonialismo interno”, reagiu a pesquisadora da Universidade Federal do Pará (UFPA), Violeta Loureiro, em recente rodada de conversas sobre mudanças climáticas em Manaus.  O marido de Violeta, poeta e escritor João de Jesus Paes Loureiro, também da UFPA, expressou, no mesmo evento, preocupação com essa escolha, que passou pelo crivo do governo federal, por meio do Ministério das Relações Exteriores, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis e da Casa Civil da Presidência da República. 

 

Para a socióloga Marilene Corrêa, a reputação e a competência das duas instituições - FGV e USP - não estão em questão, mas adverte que é preciso vigilância sobre a metodologia a ser aplicada na formulação do documento final do encontro. Isso para que as demandas das populações amazônicas não sejam deixadas de lado.  

 

O fio da polêmica

 

Violeta Loureiro disse que apesar da boa intenção da presidência da República de colocar R$ 4 bilhões em Belém para preparar a COP30, a entrega da organização do evento à USP e à Fundação Getúlio Vargas só reforça a tese de que a Amazônia sempre foi e ainda é colônia do Brasil.  

 

Ela justifica que a sua inquietação se refere à escolha de duas instituições de impacto nacional para montar um evento da dimensão da COP30, porque esse comportamento ignora os saberes e conhecimentos que existem na Amazônia. 

 

“A escolha da FGV e USP, instituições de alta competência, é, de certa forma, a reprodução de uma mentalidade colonialista que se reproduz internamente. É mais um exemplo desse comportamento de como o governo central brasileiro, historicamente, sempre, e até hoje, imagina a Amazônia como uma colônia do resto do Brasil”, reafirma Violeta. 

 

Fora da região

 

“A COP30 está sendo organizada fora da região. Já vi, por exemplo, investimentos fantásticos em atividades artísticas e culturais em grandes grupos de fora daqui da região”, advertiu Paes Loureiro.  

 

Há, segundo o poeta, uma sensação muito grande de que a COP30 deixe apenas benefícios materiais para Belém, em razão do dinheiro destinado à preparação da cidade para receber o evento. “A COP30 pode vir a ser, também, o exemplo melancólico do que o conhecimento produzido na Amazônia seja deixado de lado, e do conhecimento das pessoas, lá de fora, que acham ter sobre a região”, afirmou. 

 

Efeitos históricos 

 

Na avaliação de Loureiro, a Amazônia sofre hoje os efeitos da história de silenciamento da sua própria história, da sua própria cultura. No entanto, mostra que “a força da função que o imaginário possui é absolutamente original e diversa”.  

 

“A Amazônia é uma diversidade diversa. Não é uma diversidade comum. Ela tem muitos mais sentidos e diferenças que outras regiões”, sustentou Paes Loureiro. 

 

Sintetizando o caso

 

No entendimento de Marilene Corrêa, as populações da Amazônia estão contempladas na COP30. No caso, por meio dos debates que antecedem ao evento. Mas ela reconhece que a metodologia de sintetização dos interesses dos segmentos sociais deveria ser elaborada por instituições mais próximas desses diálogos, ou seja, com as pessoas que moram na região e produzem conhecimento nela. 

 

“Por que a FGV? Por que a USP”, questiona a pesquisadora, que explica que essa observação é importante porque somente os chefes de Estados, diplomatas e assessores parlamentares terão acesso às sínteses produzidas pelos grupos sociais.  

“O mais providencial seria uma metodologia elaborada e realizada por instituições que vivenciam a realidade Amazônica”, disse.

  

Marilene demarcou três grupos, ministérios, com interesses que podem se chocar: o Ministério do Meio Ambiente dialogou com a Academia e, sobretudo, com Ongs; o de Relações Exteriores acolheu lideranças quilombolas, indígenas, trabalhadoras e políticos da região amazônica; e o de Ciência e Tecnologia que dialogou, em parte, com comunidade acadêmica, em parte, com instituições diplomáticas e, em parte com Ongs. 

 

“Não posso dizer que os grupos sociais, especialmente os do interior da Amazônia, não estivessem mobilizados para os debates da pré-COP”, argumenta.  O que deve ser evidenciado é que os interlocutores do evento mudaram nessa COP. “Não são mais só os acadêmicos, as instituições acadêmicas, os campos disciplinares e os ditos intelectuais. Agora participam todos os movimentos sociais”, acentuou Marilene.  

 

Ela sugere, então, que as instituições próximas aos debates preparatórios também coordenem a elaboração do documento final, ao invés da FGV e da USP, que são instituições distantes da vivência amazônica. 

 

Papo Reto

 

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