UFPA perde corrida pela organização da COP30 para FGV e USP, mas, de quem é a culpa?

Suposto afastamento da Universidade paraense do planejamento da Conferência do Clima da ONU em Belém gera debates e críticas ao que estudiosos chamam de “colonialismo interno”.

18/01/2025, 11:00
UFPA perde corrida pela organização da COP30 para FGV e USP, mas, de quem é a culpa?
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suposto afastamento das instituições de ensino e pesquisa da Região Norte da COP30, objeto de críticas recentes por conta da escolha da Fundação Getúlio Vargas e da Universidade de São Paulo para planejar e organizar a Conferência em Belém, merece algumas considerações por parte de especialistas, inclusive da UFPA.


Professora Violeta Loureiro abre debate sobre a organização do evento, entregue a universidades de fora, uma delas recebida pela Reitoria, em Belém/Fotos: Divulgação.

É fato que instituições de grande tradição, como a UFPA, se afastaram e até fizeram oposição ao governo do Pará por questões ideológicas nos últimos anos. Como todo mundo está careca de saber, a Universidade é gerida há alguns anos de acordo com os interesses de um partido político, o Psol, que, última eleição no Estado, apresentou candidato contra o atual governador e, mais recentemente, tem se colocado como oposição direta ao MDB na Prefeitura de Belém.

 

Tudo junto e separado

 

Totalmente partidarizada e aparelhada na gestão do ex-reitor Emmanuel Tourinho, que durou até o final do ano passado, a UFPA, além de se afastar, se recusou a participar de iniciativas ou parcerias propostas pelo governo, mesmo as de cunho mais institucional - algo que o atual reitor, professor Gilmar Pereira, parece ter incorporado. Esses gestores devem ter esquecido que dirigem uma instituição de ensino e pesquisa e não um partido político e, que, para além de questões partidárias, existe uma série de ações e projetos de interesse coletivo que demandam a atuação conjunta UFPA e Estado.

 

E os pesquisadores, de passagem - alguns vinculados à UFPA - que acusam o governo de " colonialismo interno", como no caso de reportagem  recente da BNC Amazonas,  por supostamente prestigiar instituições de pesquisas não locais na organização da COP30, idem com relação ao fato de que a própria UFPA tem trazido a USP para "guiar" as ações de pesquisa na região amazônica, conforme outra matéria, esta divulgada pela universidade em seu site, sob o título "Em visita à UFPA, o pesquisador Paulo Artaxo, diretor do recém-criado Centro de Estudos da Amazônia Sustentável, da USP, reuniu-se com o reitor, Emmanuel Tourinho para discutir possibilidades de parcerias em pesquisas na Amazônia."

 

Milagre e santo de casa

 

À época, essa reunião causou forte reação dos pesquisadores e das unidades acadêmicas da UFPA que se dedicam, há décadas, à investigação de temas amazônicos e que foram ignorados pela Reitoria, que demonstrou total desprezo pelo próprio capital intelectual, onde se destacam docentes reconhecidos internacionalmente como expoentes pesquisadores da Amazônia.

 

A antiga máxima segundo a qual “santo de casa não faz milagre” parece guiar as decisões dos magníficos reitores da Universidade.

 

Colonialismo interno

 

Veja, em sequência, trechos da reportagem do BNC Amazonas sobre o chamado “colonialismo interno” praticado pelo Estado, assinada pelo jornalista Wilson Nogueira, e as informações sobre a visita do representante da USP à UFPA:

 

A escolha da Fundação Getúlio Vargas e da Universidade de São Paulo para planejar e organizar a Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas no Brasil, a COP30, marcada para novembro em Belém (PA), é problematizada por pesquisadores da região.

“Esse é mais um caso de colonialismo interno”, reagiu a pesquisadora da Universidade Federal do Pará (UFPA) Violeta Loureiro, em rodada de conversas sobre mudanças climáticas promovida pela Valer Teatro, em Manaus.

O poeta e escritor Paes Loureiro, também da UFPA, expressou, no mesmo evento, a sua preocupação com essa escolha, que passa pelo crivo do governo federal, por intermédio do Ministério das Relações Exteriores, do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) e da Casa Civil da Presidência da República.

 

Para a socióloga Marilene Corrêa, a reputação e a competência das duas instituições não estão em questão. Mas a pesquisadora adverte que é preciso vigilância sobre a metodologia a ser aplicada na formulação do documento final do encontro. Isso para que as demandas das populações amazônicas não sejam deixadas de lado.

 

De boas intenções...

 

Violeta Loureiro disse que apesar da boa intenção do presidente Lula de colocar R$ 4 bilhões em Belém para preparar a COP-30, a entrega da organização do evento à USP e à Fundação Getúlio Vargas só reforça a sua tese de que a Amazônia sempre foi e ainda é colônia do Brasil.

 

Ela é autora do livro Amazônia colônia do Brasil (Valer), lançado em Manaus na Valer Teatro, em sessão de autógrafos. O livro é resultado de estudos das etapas do colonialismo na região e seus efeitos na contemporaneidade amazônica.

 

Ela justifica que a sua inquietação se refere à escolha de duas instituições de impacto nacional para montar um evento da dimensão da COP-30, porque esse comportamento ignora os saberes e conhecimentos que existem na Amazônia.

 

 “A escolha dos grupos [FGV e USP), instituições de alta competência, mas, de certa forma, é a reprodução de uma mentalidade colonialista que se reproduz internamente. É mais um exemplo desse comportamento de como o governo central brasileiro, historicamente, sempre, e até hoje, imagina a Amazônia como uma colônia do resto do Brasil”, reafirma.

 

UFPA chama USP

 

Em visita à Universidade Federal do Pará, o pesquisador Paulo Artaxo, diretor do recém-criado Centro de Estudos da Amazônia Sustentável da USP, reuniu-se com o reitor da UFPA para discutir possibilidades de parcerias em pesquisas na Amazônia. O encontro ocorreu na última terça-feira, 13 de junho, no Gabinete da Reitoria, com as participações da pró-reitora de Pesquisa e Pós-Graduação da UFPA, Iracilda Sampaio, e da coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Ciências Ambientais da UFPA, Julia Cohen.

 

Paulo Artaxo explicou que o Ceas foi criado em março de 2023 como um órgão vinculado diretamente à Reitoria da USP e possui um Comitê Gestor composto de seis pesquisadores, com representantes de instituições da Amazônia. Agora o Centro está em fase de aprovação do seu regimento interno e de constituição de um Comitê Consultivo, que deverá ser formado metade por pesquisadores da Amazônia e metade por pesquisadores de outras regiões brasileiras.

 

O reitor Emmanuel Tourinho agradeceu a busca de diálogo, destacou a liderança nacional de Paulo Artaxo e lembrou que o pesquisador já colaborou em projetos com a participação da UFPA em outras ocasiões. Em seguida, ressaltou que a UFPA é hoje a maior universidade da Pan-Amazônia, destacando-se também como a segunda maior universidade brasileira em número de alunos e a sexta, em número de programas de pós-graduação, o que demonstra seu porte de produção de conhecimento e formação de profissionais e pesquisadores especializados na região. Essa potência da Universidade já vem sendo reconhecida nacional e internacionalmente por meio de avaliações e rankings.

 

Ações atropeladas


Após essa contextualização, Emmanuel Tourinho reforçou que, assim como a UFPA, outras instituições de ensino e pesquisa na Amazônia têm um papel fundamental para a ciência da região e do País, contudo muitas vezes são invisibilizadas em políticas nacionais de financiamento e apoio à pesquisa.

 

“Nossas instituições e pesquisadores da Amazônia lutam em fóruns nacionais por uma distribuição equitativa dos investimentos em educação e ciência e pelo fim das assimetrias históricas nessa partilha de recursos. Apesar de representarmos 10% do Produto Interno Bruto e da população do País, não recebemos nem 5% dos investimentos em ciência e tecnologia. A UFPA, por exemplo, recebe menos recursos para o ensino e para a pesquisa que outras instituições de igual ou menor porte, mesmo sediada em uma região cujos custos operacionais e de pesquisa são muito acima dos do Sul e do Sudeste”, ponderou o reitor.

 

Simetria intelectual


Por meio de diálogo sobre possibilidades de parcerias entre o Ceas-USP e a UFPA, foi definida a elaboração de um termo de cooperação entre as instituições, com a garantia da simetria na liderança intelectual de projetos e na gestão dos recursos captados com participação de pesquisadores da UFPA e da USP (Texto: Assessoria de Comunicação Institucional da UFPA).

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