Sequestro de carbono é alvo de disputa no Marajó, com denúncia de assédio de empresa privada

Associação trava disputa contra práticas supostamente indevidas do Ecomapuá Amazon Redd Project desde 2022, mas nenhuma providência oficial foi tomada até o momento.

07/06/2025, 11:00
Sequestro de carbono é alvo de disputa no Marajó, com denúncia de assédio de empresa privada
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enos de um mês após o Ministério Público Federal pedir a suspensão e a anulação do contrato internacional de compra e venda de créditos de carbono firmado entre o governo do Pará e uma coalizão de governos estrangeiros e multinacionais, o Conselho Nacional das Populações Extrativistas, CNS, emitiu nota pública para denunciar o assédio que, segundo a instituição, a empresa Ecomapuá Conservação tem exercido sobre ribeirinhos e extrativistas.

Empresa opera em cinco fazendas dos municípios de Breves, Curralinho e São Sebastião da Boa Vista, todos no Marajó/Fotos: Divulgação.
A nota foi emitida em defesa da Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Mapuá (Amorema), que abrange a área entre os rios Mapuá e Aramã, na Ilha do Marajó. De acordo com o CNS, dirigentes, associados e pessoas que vivem na região têm sido pressionados por representantes da empresa, responsável por um dos maiores projetos de sequestro de carbono no Estado.

Sem providências

Dirigentes da Amorema afirmam que já entraram com um processo judicial denunciando práticas indevidas do Ecomapuá Amazon Redd Project, relacionado à venda de créditos de carbono, mas até hoje nenhuma medida foi tomada pelos órgãos competentes. O projeto existe desde 2002 e atua em cinco fazendas dos municípios de Breves, Curralinho e São Sebastião da Boa Vista, todos no Marajó.

No caso da suspensão solicitada pelo MPF no acordo firmado pelo governo do Pará com órgãos intencionais, o principal argumento foi “a ausência de consulta prévia, livre e informada aos povos e comunidades tradicionais antes da assinatura e da definição de preços dos créditos”. Representantes da Amorema afirmam que também nunca foram consultados pela Ecomapuá Conservação, o que, por si só, seria motivo suficiente para, ao menos, investigar as ações do projeto.

Dessa forma, a empresa não reconhece os moradores como atores importantes no processo de conservação da área, nem dá espaço para participação deles em tomada de decisão ou participação nos valores arrecadados”, afirma a direção do CNS.

Ocupação indevida

Ainda de acordo com a nota pública, mais da metade da área usada pela Ecomapuá Conservação em seu projeto está dentro das Reservas Extrativistas (Resexs) - Mapuá e Terra Grande-Pracuúba, onde comunidades tradicionais desenvolvem atividades de sustentação a partir do agroextrativismo e detêm o direito de uso da área, conforme o contrato de Concessão de Direito Real de Uso, o CDRU.

“É importante esclarecer que, em nenhum momento, a Amorema agiu com o objetivo de prejudicar a empresa. Pelo contrário, ao tomar conhecimento das ações realizadas sem transparência e sem participação comunitária, buscou os meios legais apropriados para garantir os direitos das populações tradicionais e promover o diálogo”, explica a nota.

O documento também ressalta que a associação procurou a empresa para negociar sobre as práticas e o pagamento dos ativos gerados, mas nunca foi atendida. O CNS finaliza a nota solicitando o apoio das autoridades competentes, sobretudo do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, o ICMBio, para apuração dos fatos e a garantia da segurança dos moradores e lideranças das Resexs.

A Ecomapuá Conservação foi procurada pela Coluna Olavo Dutra para se manifestar sobre o assunto, mas até a publicação desta matéria não houve retorno. O espaço segue aberto para possíveis manifestações.

Confira a nota pública na íntegra

Nota Pública da Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Mapuá - Amorema.

A Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Mapuá - Amorema, na condição de entidade legítima e responsável pela representação das comunidades residentes na referida Unidade de Conservação, vem a público manifestar sua preocupação e solicitar providências em relação ao assédio que vem sendo praticado por representantes da empresa Eco Mapuá contra dirigentes, associados e moradores da Reserva.

Acreditamos que tais ações estejam relacionadas ao processo judicial em curso, no qual Amorema questiona práticas indevidas da empresa no âmbito da comercialização de créditos de carbono. Constatamos que um projeto relacionado a esse mercado já estava sendo executado há algum tempo, sem o conhecimento ou consentimento da comunidade local, legítima detentora do direito de uso da área conforme contrato de Concessão de Direito Real de Uso (CDRU).

É importante esclarecer que, em nenhum momento, a Amorema agiu com o objetivo de prejudicar a empresa. Pelo contrário, ao tomar conhecimento das ações realizadas sem transparência e sem participação comunitária, buscou os meios legais apropriados para garantir os direitos das populações tradicionais e promover o diálogo. Inclusive, foi aberta a possibilidade de negociação, visando a regularização das práticas da empresa e o pagamento justo pelos ativos gerados a partir do uso dos territórios da Reserva Extrativista Mapuá.

Reafirmamos nosso compromisso com a justiça social, a defesa dos direitos das comunidades tradicionais e a proteção dos princípios que regem as Reservas Extrativistas. Não aceitaremos intimidações, perseguições ou qualquer tentativa de silenciar a organização legítima dos povos da floresta.

Solicitamos às autoridades competentes a devida apuração dos fatos e medidas urgentes para garantir a segurança e integridade dos moradores e lideranças da Reserva.

Associação dos Moradores da Reserva Extrativista Mapuá - Aamorema

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