Facções criminosas dominam Cabanagem, cobram "taxas" e restringem campanha eleitoral em Belém

Invasões de comitês e ameaças marcam as ações de grupos que a política de enfrentamento do Estado ainda não alcançou.

25/09/2024 08:00

Enquanto a Polícia discute providências, os grupos atacam, como no caso do candidato Léo do Bengui/Fotos: Divulgação-Redes Sociais.


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m meados deste mês, uma pesquisa do Datafolha encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública e pelo jornal “Folha de S. Paulo” mostrou que em meio à dominação territorial nas grandes cidades brasileiras, mais de 3 milhões de pessoas pagam taxas a grupos armados para garantir a própria segurança e ter acesso a serviços. Segundo o estudo, mais de 23 milhões de brasileiros vivem em áreas dominadas por milícias ou facções e mais de 27 milhões convivem com ‘cracolândias’ a caminho da escola ou trabalho.

 

“O Estado precisa controlar e retomar o controle de territórios que estão na mão do crime organizado. Acho que a palavra-chave aqui é, que sem prevenção, não se consegue avançar nesse debate. Sem repressão qualificada, não temos muito o que vislumbrar como futuro”, afirmou Renato Sérgio de Lima, diretor-presidente do Fórum.

 

No mapa do tráfico

 

O Pará - e Belém - não estão longe da realidade. O Estado é crucial no mapa do tráfico de drogas na Amazônia.  A posição estratégica da região atrai facções que buscam controlar as rotas de exportação de cocaína rumo à África e à Europa. Sua complexa rede hidrográfica facilita o escoamento de drogas da Colômbia e Peru até alcançarem portos estratégicos, como o de Vila do Conde, em Barcarena, um dos principais pontos de partida da cocaína que atravessa o Atlântico.

 

Segundo reportagem do “Estadão”, lideranças de comunidades tradicionais relatam uma vida constantemente sob ameaças e muitas delas adotaram medidas de segurança extras, como “rondas” e o uso de tecnologias para monitorar seus territórios.

 

Cabanagem sob ameaça 

 

Uma denúncia à Coluna Olavo Dutra dá conta de que no bairro da Cabanagem, em Belém, o Comando Vermelho teria fechado acordo com um vereador do MDB, em campanha à reeleição, e apenas ele pode fazer campanha nas ruas do bairro. Ainda de acordo com a denúncia, o comitê de um candidato a vereador pelo PDT, que é médico, foi destruído, sob a ameaça de cobrança de ‘taxa’ de mais de R$ 30 mil. Outro candidato a vereador pelo partido teve que pagar R$ 5 mil.

 

Outro candidato, do PDT, sofreu tentativa de invasão à casa da mãe dele, onde seria o comitê de campanha, e ligações de números desconhecidos com ameaças. O grupo também não permitiu também a entrada de outros dois candidatos, um homem e uma mulher, no bairro.

 

Descobrindo a roda

 

Na quinta-feira, 12 deste mês, a Polícia Civil do Pará promoveu a primeira Reunião do Comitê de Gerenciamento Tático do Programa de Enfrentamento às Facções Criminosas para alinhamento das ações e compartilhamento de informações de crimes relacionados a grupos criminosos. O encontro reuniu membros das diretorias da Polícia para discutir linhas de investigação e traçar metodologias e técnicas de coleta e análise de dados, além de discutir indicadores e metas estabelecidas para os membros envolvidos na política. 

 

Lançado no dia 3 de setembro, a Política de Enfrentamento às Facções Criminosas foi criada para fortalecer as investigações na repressão e prevenção de crimes cometidos por facções.

 

Nota do redator


No curso da campanha eleitoral deste ano em Belém, as mídias sociais têm publicado informações acerca do domínio das facções criminosas nas comunidades e candidatos às eleições em toda a região metropolitana, mas não se tem conhecimento de prisões por esta razão, exceto no caso do Bengui, que ocorreu pela própria operosidade do candidato (veja vídeo).

A cobrança de “taxa de funcionamento” de serviços - comércio, internet, mototáxi e outros - atinge praticamente toda a região, e não se aplica apenas a candidatos, inclusive os que disputam a reeleição ao Legislativo, alguns deles apontados como envolvidos com esses grupos. Desses, logo, logo, sairá um grupo eleito e com imunidade parlamentar, sepultando a realidade.  

Prova de que não há ninguém bobo neste enredo.

 

Doações para campanha
eleitoral ainda são tímidas
na capital, mas candidatos
beiram limites permitidos

 

O site Congresso em Foco publicou no sábado, 21, que um político, um conselheiro de banco e empresários dos mais diversos setores, entre eles agronegócio, energia e mineração, são os principais doadores individuais das eleições municipais de 2024, de acordo com levantamento preliminar do Congresso em Foco/ 72 horas, até sexta-feira, 20.

 

O Tribunal Superior Eleitoral indica, por meio da plataforma DivulgaCand, que foram doados mais de R$ 540 milhões por pessoas físicas. Os dez principais doadores são responsáveis por R$ 20,2 milhões, o equivalente a quase 4%. Todas essas doações são legais, porque foram declaradas à Justiça Eleitoral, e podem ser consultadas a qualquer momento na plataforma.

 

Doações tímidas

 

No Pará, as doações de pessoas físicas são ainda tímidas, e os maiores valores ainda são dos fundos partidários. Ou ainda não apareceram desde a última prestação de contas, feita na sexta-feira, 13. Mas há números interessantes.

 

Por exemplo, em Ananindeua, o candidato Antônio Doido, do MDB, que é empresário, doou para a própria campanha R$ 170 mil. Para a campanha de Doido, Yan Rocha de Sousa doou R$ 94 mil. Na primeira prestação de contas, no início da campanha, Antônio Doido declarou um valor baixíssimo, mas com a última atualização no site DivulgaCand, ele já tem em caixa R$ 1.684.000,00, que é quase o total permitido pelo TRE para as despesas de campanha para prefeito em Ananindeua: R$ 1.730.153,93.

 

Ainda em Ananindeua, a campanha de Dr. Daniel recebeu dele, como pessoa física, R$ 100 mil, e para atingir os R$ 1,7 milhão permitidos, ele ainda tem que receber doações de cerca de R$ 600 mil.

 

Fundo partidário

 

Em Belém, o ‘fenômeno’ fundo partidário se repete. Eder Mauro, do PL, por exemplo, tem em caixa, agora, R$ R$ 2.542.275,68 de recursos recebidos, e esse valor já supera os R$ 2.092.675,68, em limite de gastos, permitidos pelo TRE para a campanha de prefeitos em Belém. O maior doador, pessoa física, é ele mesmo, com R$ 51 mil.  O candidato Delegado Eguchi declarou que continua apenas com os R$ 100 mil para gastos, que vieram do PRTB. Edmilson Rodrigues já quase alcançou o valor teto do limite de gastos e tem em caixa, agora, R$ 2.084.500,00, com as maiores doações vindas do Psol e do PT.

 

Igor Normando, que estava ‘pobrezinho’ no início da campanha, agora, já tem em caixa, R$ 1.913.408,11, mas vai chegar, com certeza, nos R$ 2.092.675,68. Thiago Araújo, do Republicanos, tem R$ 1.913.014,00 em doações, a maioria vinda do fundo partidário, mas teve pessoas físicas doando a ele, como os R$ 100 mil do vereador Marcos Roberto Xavier, e os R$ 66 mil da vereadora Nazaré Teixeira. 

 

Na ponta do lápis


Ítalo Abati, que declarou zero valor para gastar na campanha, já tem R$ 51.283,30, que vieram da direção nacional do partido Novo. Jefferson Lima, do Podemos, que também estava ‘pobrinho’ no início da campanha, já tem R$ 2.002.500,00. Raquel Brício, do União Popular, teve aumento de um tiquinho assim em doações e agora tem R$ 24 mil em caixa. Já a candidata Well, do PSTU, que não tinha doações, agora, tem R$ 35.800,00, na totalidade, vindos do fundo partidário.

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