As causas do acidente do avião ATR 72-500
da Voepass, que caiu com 62 pessoas a bordo em Vinhedo (interior de São Paulo),
no dia 9 de agosto, começarão a ser reveladas nesta sexta-feira, 5. A Força
Aérea Brasileira (FAB) vai divulgar, a partir das 17h, um relatório preliminar
desenvolvido pelo Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos
(Cenipa), que promete dar detalhes do andamento das investigações que apuram os
motivos da tragédia.
O avião, de matrícula PS-VPB, caiu no interior de São Paulo durante o trajeto
que fazia de Cascavel, no Paraná, até o Aeroporto Internacional de Guarulhos,
na Grande SP. Os peritos do Cenipa trabalham para descobrir as causas da queda
desde o dia do acidente. De lá pra cá, passos importantes foram dados para a
construção do relatório que, como afirma a FAB, não tem o objetivo de apontar
culpados ou responsabilizar pessoas, mas de investigar o caso de modo a
prevenir novas ocorrências semelhantes.
Entre os avanços na investigação está a recuperação intacta das caixas-pretas
(que são os gravadores de voz da cabine) e do gravador de dados do voo (Flight
Data Recorder). Segundo o Cenipa, os dispositivos, feitos para resistirem aos
acidentes, conseguiram gravar com sucesso as conversas entre pilotos,
tripulação e torre de controle, além de dados como velocidade do avião,
altitude do voo e condições climáticas.
Nesta fase de Análise de Dados também são examinadas atividades relacionadas ao
voo, o ambiente operacional e os fatores humanos atrelados ao caso, bem como é
feito um estudo sobre os componentes, equipamentos, sistemas e infraestrutura
da aeronave
O relatório final, que vai apresentar as conclusões das investigações, não tem
uma data definida para ser apresentado e pode demorar mais um de ano. A Força
Área Brasileira diz que pretende terminar as apurações dentro "do menor
prazo possível", mas respeitando a complexidade do caso. "Quando
concluído, o Relatório Final será publicado no site do Cenipa", diz a FAB.
Segundo especialistas ouvidos pelo Estadão, a principal hipótese para a causa
do acidente foi o acúmulo de gelo nas asas do ATR da Voepass, que pode ter
provocado a perda da estabilidade da aeronave - o chamado estol - e causado a
queda do avião em giro vertical, movimento conhecido na aeronáutica como
"parafuso-chato".
No dia do desastre, o sistema oficial da Rede de Meteorologia da Aeronáutica
(Redemet) havia alertado sobre a possibilidade de formação de gelo severa. O
alerta não impede o avião de decolar, pois as aeronaves têm um sistema que
impede a formação de gelo. As investigações devem mostrar se o sistema do avião
em questão estava funcionando como deveria.
O meteorologista Humberto Barbosa, fundador do Laboratório de Análise e
Processamento de Imagens de Satélites (Lapis), da Universidade Federal de
Alagoas, chegou a analisar dados do voo e imagens de satélites e radar das
condições de tempo do local e reconstituiu, minuto a minuto, todo o trajeto
feito pelo avião.
A partir da análise das imagens, foi possível verificar, de acordo com Barbosa,
que a aeronave saiu rapidamente de uma área sem nuvens para outra com formação
de gelo e, em seguida, enfrentou mais uma área adversa com água supercongelada.
"A análise permitiu identificar que a aeronave enfrentou uma zona
meteorológica crítica, por quase 10 minutos, entre 13h10 e 13h19. Nesse
período, a aeronave reduziu a velocidade e atravessou nuvens supercongeladas de
até 40 graus negativos", diz o professor.
Porém, os mesmos especialistas alertam que um acidente aéreo não acontece
apenas por um único fator, e que as condições climáticas podem não ter sido as
únicas responsáveis pela tragédia. As investigações podem apontar, por exemplo,
outras possíveis causas, como falhas em mecanismos de derretimento do gelo, do
sistema de navegação da aeronave ou até de manutenção do ATR 72-500.
Outras investigações
Em paralelo aos trabalhos do Cenipa, a Polícia Civil de São Paulo também
começou a investigar o caso, por meio de um inquérito policial instaurado pela
Delegacia de Vinhedo. A Secretaria de Segurança Pública do Estado diz que
"autoridade policial prossegue com as diligências para esclarecer todos os
fatos" e que "demais detalhes serão preservados devido ao sigilo
judicial".
O Ministério Público do Trabalho (MPT) também chegou a abrir a própria
investigação, com o objetivo de verificar se a Voepass causou "lesão a
direitos ligados à segurança no ambiente de trabalho" dos quatro
tripulantes que morreram na queda do avião. O MPT informou nesta quinta que a
investigação está em curso.
Como mostrado pelo Estadão, em junho um piloto da Voepass acusou a companhia de
fazer pressão para que pilotos trabalhassem excessivamente, inclusive
desrespeitando folgas, o que causaria fadiga e aumentaria o risco de acidentes.
O que diz a Voepass
Em nota, a Voepass informou que cumpre e respeita a legislação vigente,
"com o estrito cumprimento da jornada estipulada em lei e a observância
dos critérios da categoria". No comunicado, a companhia diz ainda que
"as questões trabalhistas são acompanhadas e devidamente tratadas".
Em pronunciamento feito quatro dias após o acidente, em 13 de agosto, o piloto
e empresário José Luiz Felício Filho, presidente da Voepass, lamentou as mortes
e afirmou, na época, que a empresa estava oferecendo assistência às famílias
das vítimas e que a vida dos passageiros e tripulantes era "a prioridade
número um" da companhia aérea.
"Desde que assumi a presidência dessa empresa, em 2004, sempre construí
uma base com diretrizes sólidas e sempre pautadas pelas melhores práticas
internacionais para garantir a segurança operacional de todos", disse
Felício Filho, na ocasião.
"Como presidente e cofundador dessa empresa, estou aqui para dizer que é
um momento de grande pesar para todos nós da família Voepass. Toda nossa equipe
está voltada para garantir a assistência irrestrita aos familiares das vítimas.
Não estamos medindo esforços logísticos e operacionais para que todos recebam
nosso efetivo apoio neste momento", completou o presidente da companhia.
(Colaboraram Gonçalo Junior, Isabela Moya e Fábio Grellet).
Fonte: Estadão conteúdo
Foto: Reprodução