São Paulo, 25 - O Exército Brasileiro expulsou seis
militares investigados de bater e torturar um soldado nas dependências de um
quartel em Pirassununga, cidade do interior de São Paulo. O caso aconteceu em
16 de janeiro, no 13.º Regimento de Cavalaria Mecanizado, unidade militar para
a qual todos os envolvidos, até então, serviam. Desde o dia 24 de janeiro, a
vítima está afastada das funções para tratamento psicológico e psiquiátrico.
Em nota, o Exército disse que um Inquérito Policial Militar (IPM) foi aberto,
concluído e já remetido para a Justiça Militar da União (JMU). E afirmou que os
investigados vão responder como civis ao processo judicial. "Os militares
envolvidos no fato já foram expulsos das fileiras do Exército Brasileiro",
informou a Força, via Comando Militar do Sudeste. "O Exército Brasileiro
repudia, veementemente, a prática de maus tratos ou qualquer ato que viole os
direitos fundamentais do cidadão", completou.
Os investigados foram identificados como sendo os soldados Bonifácio, Felipe, Jonas,
Gião, Souza Fontes e o cabo Douglas. As defesas dos suspeitos não foram
localizadas. A reportagem questionou o Exército sobre quais crimes os
investigados respondem, mas não teve resposta. Pablo Canhadas, advogado que
representa o militar agredido, diz que ainda não conseguiu acesso aos autos,
mas alega que a expulsão das Forças Armadas "não é o suficiente" para
os acusados.
O episódio aconteceu durante uma distribuição das tarefas entre os soldados. Um
dos suspeitos ordenou que a vítima, junto com outros quatro colegas, fizesse a
limpeza do espaço onde acontece o descarte de materiais recicláveis. Já no
local, três dos soldados mais experientes teriam dado outro direcionamento para
a vítima, sugerindo que ela fosse cumprir a tarefa em uma câmara fria.
No local, o soldado que viria a ser agredido encontrou os outros dois militares
com uma vassoura na mão. De acordo com o advogado de defesa da vítima, Pablo
Canhadas, os investigados teriam o ameaçado com o objeto, dizendo que ele
deveria abaixar as calças: "Ou vai por bem ou vai por mal", teriam
dito os agressores. A vítima entendeu que se tratava, então, de um
"batismo" - um rito de iniciação aos soldados recém recrutados.
Ao negar a participação, diz o defensor Canhadas, os cinco soldados e o cabo
seguraram a vítima e começaram a agredi-la, tentando tirar o uniforme dele à
força. De acordo com a defesa, o soldado foi deitado de bruços e os agressores
insistiram em machucá-lo com a vassoura, o acertando na região dos glúteos, nas
coxas e cotovelos. De acordo com o advogado, o instrumento chegou a se quebrar
durante as agressões.
A vítima conseguiu escapar e correr para outra área do quartel, onde teria que
realizar outras tarefas. De acordo com o relato da defesa, o soldado voltou a
se encontrar com os mesmos seis militares, que continuaram as agressões com
novos objetos, desta vez usando ripas de palete e colher de madeira de cozinha
industrial. As agressões persistiram por mais 15 minutos, de acordo com o
advogado.
A vítima escapou novamente da tortura, mas, temendo ser novamente violentado,
resolveu não denunciar o caso para nenhum superior. O temor teria sido
reforçado com ameaças de que ele poderia sofrer novamente com agressões se
resolvesse falar sobre o que tinha acontecido.
'Não fizemos nada com você'
A reportagem teve acesso à troca de mensagens que um dos agressores teve com a
vítima. O investigado pergunta se o soldado está bem. Ele responde: "Bem
como se me arrebentaram hoje uma tortura, não sei nem o que vou fazer da minha
vida seus fdp (sic)." O agressor não pede desculpas, e se nega a admitir
ter agredido o colega: "Não fizemos nada com vc. Vc aceitou a brincadeira
(sic)."
Na troca de mensagens, a vítima mostra fotos do corpo com hematomas, como nas
nádegas e no cotovelo. Mesmo assim, o suposto agressor não admite a violência
praticada: "Quero nem papo com vc (sic)".
Surto psicótico e afastamento
De acordo com a defesa da vítima, o soldado que foi agredido teve um surto
psicótico horas depois de ser torturado. Ele ainda tentou pedir ajuda dos
oficiais superiores, mas não havia ninguém do Exército no quartel. A Polícia
Militar foi acionada com a informação de que o soldado estaria em surto e
portando uma faca.
Conforme o registro da PM, os agentes encontraram o rapaz desorientado em uma
via e dizendo que tiraria a própria vida. Ele foi levado ao Pronto Socorro de
Pirassununga e liberado após receber medicação e fazer exames médicos. Ele
ficou internado por 12 horas na unidade. Um tio da vítima o acompanhou, e o
comando do Exército também foi informado sobre o ocorrido.
Após receber alta, o soldado foi à delegacia e prestou queixa contra os
agressores e realizou exames de corpo de delito. Em nota, a Secretaria da
Segurança Pública do Estado (SSP-SP) confirmou que um soldado do Exército, de
19 anos, registrou um boletim de ocorrência de agressão no 1.° Distrito
Policial de Pirassununga.
"A denúncia foi encaminhada ao Exército Brasileiro, que prossegue com as
apurações. Mais detalhes devem ser solicitados ao órgão responsável",
informou a pasta.
De acordo com o advogado, a vítima passou por exames e recebeu um afastamento
de 45 dias para tratamento psicológico e psiquiátrico. "Ele encontra
realizando os tratamentos e utiliza de medicação para controlar os ataques de
pânico e ansiedade", diz o advogado Pablo Canhadas.
E, com medo de sofrer represálias, ele chegou a mudar de endereço também.
"Meu cliente mudou de residência por conta do pânico de pensar que um
deles (agressores) pudesse ir até sua casa. E, como não há nenhuma ameaça
efetiva, não temos fundamento para uma medida protetiva", disse.
'Expulsão não é o suficiente'
Na avaliação de Canhadas, a expulsão do Exército "não é o suficiente"
aos seis militares investigados de agressão. "Ele foi vítima de vários
golpes utilizando objetos contundentes (cabo de vassoura, remo culinário,
pedaços de paletes) na região das nádegas, posterior das coxas e
cotovelo", disse o advogado. "Medidas de prevenção devem ser
adotadas".
Ainda conforme o defensor, a defesa trabalha para que o soldado retorne ao
Exército de forma segura. "A primeira abordagem nossa é garantir os
direitos fundamentais da vítima. Tendo em vista o dano psicológico que ela
sofreu, pretendemos garantir primeiramente um tratamento digno, que garanta, se
possível, o retorno às atividades normais da vítima, e a possibilidade dele
seguir sua carreira militar que sempre sonhou em seguir".
Julgamento
Exército expulsa 6 militares investigados por torturar soldado em SP
Vítima está afastada das funções para tratamento psicológico e psiquiátrico.
25/02/2025, 10:00