Os sinistros de trânsito continuam a impor uma carga pesada
ao sistema público de saúde no Brasil. Só em 2024, foram registradas 227.656
internações hospitalares no SUS por sinistros terrestres, o equivalente a uma
vítima recebendo atendimento de emergência a cada dois minutos. O dado faz
parte de um levantamento das Associações Brasileiras de Medicina do Tráfego
(Abramet) e Medicina de Emergência (Abramede), realizado no contexto da
campanha Maio Amarelo 2025, campanha de conscientização pela saúde e segurança
no trânsito.
“O trânsito brasileiro é uma epidemia silenciosa. As
emergências estão lotadas de vítimas de circunstâncias evitáveis, com um custo
humano, social e econômico altíssimo”, afirmou o presidente da Abramet, Antonio
Meira Júnior. “Atuamos diariamente nas emergências e vemos o peso dessa
tragédia nos hospitais. Isso exige resposta do Estado, da sociedade e de todos
os atores do sistema de mobilidade”, complementou a presidente da
Abramede, Camila Lunardi.
O impacto sobre o Sistema Único de Saúde é alarmante: nos
últimos dez anos, o SUS contabilizou 1,8 milhão de internações por
sinistros de trânsito, segundo as bases oficiais do Ministério da Saúde,
totalizando R$ 3,8 bilhões em despesas hospitalares diretas. Segundo os
médicos, essas ocorrências pressionam cada vez mais os leitos de UTI e
prolongam as internações, agregando outros custos com múltiplos procedimentos e
reabilitação, com impacto também sobre a previdência e a assistência social.
“Como médicos, estamos profundamente preocupados com a
preservação da vida e da saúde dos brasileiros. Ver tantos recursos sendo
consumidos por tragédias evitáveis no trânsito é frustrante, porque sabemos que
esse valor poderia estar sendo investido em melhorias que beneficiariam todo o
sistema de saúde e salvariam ainda mais vidas”, afirmou Meira Júnior.
Com os R$ 3,8 bilhões gastos diretamente pelos SUS com
internações por sinistros de trânsito, seria possível, por exemplo, construir
de 32 a 64 hospitais de médio porte, implantar até 35 mil quilômetros de
ciclovias urbanas, duplicar cerca de 505 quilômetros de rodovias federais,
adquirir mais de 15 mil ambulâncias básicas ou habilitar quase 13 mil novos
leitos de UTI.
Mais vulneráveis – As vítimas que estavam em
motocicletas no momento do acidente concentram mais de 60% de todos os
casos no período. Em 2024, o número chegou a 150 mil internações,
mais do que o total somado de pedestres e ciclistas no mesmo ano. Os pedestres
formam o segundo maior grupo de vítimas atendidas nas emergências por acidentes
de trânsito, com 16% dos casos no período. Em seguida, aparecem os
ciclistas e ocupantes de automóveis, ambos com 7% do total de sinistros
registrados entre 2015 e 2024.
O conjunto desses dados confirma que os sinistros seguem um
padrão de vitimização que afeta majoritariamente homens jovens, mas também
impõe riscos a crianças, adolescentes e idosos. Do total de internações
registradas nos últimos dez anos, 78% foram de pessoas do sexo masculino,
enquanto apenas 22% envolveram mulheres.
Em relação à faixa etária, o maior volume de internações
está entre os jovens de 20 a 29 anos, que totalizaram cerca
de 28% de todas as internações. Em seguida, aparecem os adultos de 30 a 39
anos e os de 40 a 49 anos. Somadas, essas três faixas etárias respondem por
mais de 65% de todas as hospitalizações.
Mas a exposição ao risco no trânsito começa desde os
primeiros anos de vida, muitas vezes associada à ausência de equipamentos de
retenção infantil ou a comportamentos inadequados: 15% dos casos estão entre
menores de 20 anos. Embora representem uma fatia menor em termos absolutos
(9%), os idosos são mais vulneráveis à gravidade das lesões e à evolução
desfavorável dos traumas.
Problema crescente – Entre 2015 e 2024, o
crescimento no número de internações por sinistros de trânsito foi contínuo,
com um aumento de 44% no período: de 157.602 em 2015
para 227.656 em 2024. Os dados também revelam um cenário preocupante e
crescente em todas as regiões, com destaque para o impacto expressivo em
estados com maior frota circulante.
O Sudeste lidera com folga em números absolutos, somando
747.757 internações no período, o que representa mais de 40% do total nacional.
O estado de São Paulo, sozinho, responde por 387.991 dessas ocorrências, sendo
o maior número do País. Minas Gerais também se destaca com 218.402 internações
no período, seguido do Rio de Janeiro (94.895). Em 2024, a região alcançou seu
pico, com 92.754 internações.
O Nordeste é a segunda região com maior volume, totalizando
514.702 internações nos dez anos analisados. Estados como Bahia (107.820),
Ceará (107.107) e Piauí (72.140) concentram os maiores números. A região
apresentou crescimento constante, com destaque para a Paraíba e Sergipe, que
praticamente dobraram seus registros entre 2015 e 2024.
No Sul, foram registradas 208.698 internações no período,
com certa estabilidade e leve tendência de alta. O Paraná lidera na região com
98.539 casos, seguido por Santa Catarina (71.794), que apresenta alta
incidência proporcional à sua população. Em 2024, a região registrou 24.670
internações, o maior número da série histórica local.
A Região Centro-Oeste também apresentou crescimento
significativo, com 208.173 internações entre 2015 e 2024. O número anual
praticamente dobrou em uma década, passando de 12.859 para 25.407. Goiás lidera
com 98.343 registros, seguido por Mato Grosso (43.466). O Distrito Federal teve
evolução constante, alcançando 4.182 internações em 2024, mais do que o triplo
registrado em 2015.
Já a Região Norte totalizou 157.656 internações no período,
com crescimento mais gradual. O Pará concentra quase metade das ocorrências da
região, com 71.087 internações. Tocantins e Roraima também apresentam
crescimento expressivo. Em especial, o Amapá registrou um salto em 2024, com
1.001 internações — quase três vezes mais que a média dos anos anteriores.
Foto: Agência Brasil |